Meditação


Jabu

Eu sempre fui apaixonado por Saori. Desde criança eu me submetia a todas as suas vontades. Saori, neta de um milionário, uma menina muito mimada. Senhor Kido e Tatsume faziam tudo o que ela queria. Eu poderia me incluir nesta lista.

Ela tratava a todos nós, do orfanato, como empregados. A maioria se rebelava contra tal atitude, principalmente Seiya. Mas não eu. Submetia-me. Doía cada vez que ela me humilhava, algumas de suas brincadeiras chegaram a me ferir fisicamente, porém meu amor não via limites. Eu faria qualquer coisa por ela. Mas ela nunca pareceu se importar com meus sentimentos. Por mais que me doesse e magoasse o tratamento indiferente que ela me dirigia, eu não conseguia me livrar daquele sentimento. Eu era visto como seu "cachorrinho"; um puxa-saco pelos demais garotos e Seiya fazia questão de me jogar isso na cara quando nos desentendíamos. Sinto-me um fraco ao admitir tal coisa, mas eu estava apaixonado por ela.

Aos sete anos de idade eu fui enviado à Argélia para conquistar a Armadura Sagrada de Unicórnio. Eu fui com um único objetivo: Fazer Saori se orgulhar de mim.

Meu treinamento foi árduo, como o de todos os outros Cavaleiros, exceto Ikki, ninguém sofreu como ele. Oito anos depois eu estava de volta ao Japão para participar do Torneio Galáctico.

Meu primeiro oponente era Shun de Andrômeda. Eu sabia que Saori estava assistindo àquela luta, queria fazê-la me admirar. Mas a coisas não saíram como eu esperava. Eu subestimara Shun.

Quando criança ele sempre fora chorão e por ser o menor, era sempre arreliado pelos mais velhos. Esperava encontrá-lo assim, fraco e dependente. Apesar de sua aparência frágil, Shun era muito forte. Eu não consegui sequer tocá-lo. A forma como ele dominava aquelas correntes fazia com que elas fossem como parte de seu corpo. Suas técnicas de defesa e ataque eram perfeitas. Apanhei muito até que a luta foi interrompida pelo aparecimento de Ikki, irmão mais velho de Shun e por toda a confusão que aquele causara, mas não apagou e nem justificou a humilhação que sofri pela derrota. A dor era ainda maior, pois tombei diante de Saori... Como eu poderia esperar que ela me admirasse se eu não conseguia vencer uma única luta?

Depois desse dia, surgiram revelações surpreendentes e descobrimos que Saori era a reencarnação da deusa grega Athena. Todos percebemos que esta revelação provocou uma revolução com relação às atitudes dela para conosco. Ela parou de nos ver como seus "empregadinhos" e passou a respeitar-nos.

Com a volta de Seiya ao Japão e a convivência diária entre ele e Saori, eu comecei a sentir que a birra dos tempos de crianças aos poucos se transformava em um sentimento diferente. Os laços que se estreitavam entre eles ficavam cada vez mais evidentes, principalmente durante as batalhas, nas quais Seiya se entregava de corpo e alma para defender a reencarnação de Athena.

Eu fazia o que eu podia por ela, mas tinha consciência de que era inferior a Seiya, Shiryu, Hyoga, Shun e Ikki.

Minhas divergências com Seiya caíram por terra. Eu não podia deixar de admirá-lo por sua coragem e determinação. Aos poucos conseguimos nos entender, não poderia dizer que tornáramos amigos, mas já não éramos mais "inimigos".

Com o fim das batalhas, Seiya arriscou-se e se declarou a ela que o aceitou imediatamente. Tomada e anunciada sua decisão, eu perdi completamente as esperanças de conquistá-la e decidi me afastar, pois o mais importante pra mim era sua felicidade e esta felicidade era ao lado de Seiya, eu já havia admitido isso.


Mino

Conheço Seiya desde criança. Acompanhei seu sofrimento quando ele foi separado de sua irmã, Seika e levado para a Fundação Mitsumasa Kido e de lá, enviado a Grécia, para conquistar a Armadura Sagrada de Pégaso. Já era apaixonada por ele desde essa época.

Durante a temporada de Seiya na Grécia, eu me senti muito sozinha, mas torcia por ele. Sabia que Seiya empenhava-se, pois Mitsumasa Kido lhe prometera que encontraria sua irmã se ele trouxesse a dita armadura. Ele ficou oito anos na Grécia, e eu fiquei esperando por ele, sentindo muita saudade.

Seiya fôra ao orfanato logo depois de voltar da Mansão Kido. Ele estava sentindo muita raiva de Mitsumasa Kido e também de Saori. Ele ficou furioso quando voltou e soube que a promessa feita anos atrás, não fôra cumprida. Saori propusera-lhe que se ele participasse do Torneio, ela faria o possível para encontrar Seika, mas Seiya não confiava nela e acabaram por discutir o que provocou um desentendimento sério com Jabu.

Seiya estava furioso. Aquela proposta soara-lhe como uma vil chantagem para que ele participasse daquele Torneio sem sentido. Mas eu o convenci do contrário. O evento seria transmitido para todo o mundo... talvez Seika o visse pela TV e fosse procurá-lo. Ele se animara com a idéia e procurara Saori. Participaria daquele "circo".

Eu o vi lutando na TV e não agüentei. Eu tinha que estar perto dele naquele momento. Corri para o Coliseu e vi a quase morte de meu amigo e amor numa luta fantástica contra Shiryu de Dragão. Ele foi internado no hospital da Fundação e quando estava devidamente recuperado pudemos conversar com calma, colocar os assuntos em dia.

Com volta dele ao Japão, tornamo-nos a nos aproximar. Ele sempre ia ao orfanato onde eu trabalhava para ver-me e conversarmos. Num desses encontros, quase acontecera um beijo entre nós, mas o clima fora interrompido por alguns garotos que nos estavam espiando. Naquele dia eu tive uma esperança de que meus sentimentos eram retribuídos. Esperança que se esvaiu nos dias que se seguiram.

O tempo passava e eu percebi que Seiya estava cada vez mais distante. Suas visitas se tornaram menos freqüentes e quando vinha falava em Saori o tempo todo. Ela mudara depois que descobrira ser a reencarnação de Athena, amadurecera e passara a respeitar os outros Cavaleiros. Os sentimentos de Seiya por ela também mudaram. Já não era mais raiva e desprezo o que ele sentia quando fala nela. O amor dele por Saori era evidente e isso me machucava. Seiya arriscara-se inúmeras vezes por ela e quase me matava cada vez que eu tomava conhecimento de que ele estava ferido.

Depois de as batalhas finalmente terem chegado ao fim, Seiya viera a mim e confidenciou seu amor por Saori e disse que pretendia se declarar a ela. Mesmo me doendo saber daquela decisão, eu apoiei Seiya. Logo a notícia de que os dois estavam juntos se espalhou.

Eu não queria me sentir daquela forma, mas não consegui evitar a dor que tomou meu coração quando eu soube que eles estavam namorando. Mas... Eu fiquei feliz por ele. Seiya é meu amigo e sua felicidade é muito importante pra mim. Mesmo que essa felicidade não seja ao meu lado.

Quem acreditou

No amor, no sorriso e na flor

Então sonhou, sonhou

E perdeu a paz

O amor, o sorriso e a flor

Se transformam depressa demais


Jabu

O dia do casamento de Seiya e Saori chegou logo. Eles estavam juntos há quase dois anos. Eu não queria ir. Aquele era o pior momento da minha vida. Ter que presenciar aquele acontecimento. Ver a felicidade, que embora eu não quisesse, me machucava profundamente... Era uma tortura.

Eu pensei em inventar alguma coisa pra não precisar ir, mas não consegui negar quando eles me convidaram pessoalmente, depois de minha demora em confirmar presença na cerimônia.

E lá estava eu. Sentado num daqueles bancos, naquela igreja, esperando o momento em que Saori entraria por aquela porta e se uniria a Seiya. O tempo parecia não passar. Eu via a ansiedade de Seiya, andando de um lado para o outro no altar, sendo acalmado pelos amigos e sentia minha própria ansiedade, mas por motivos bem distintos. Eu queria que aquela tortura acabasse logo.

Quinze minutos se passaram e então a marcha nupcial começou a tocar. Todos se levantaram e eu olhei para a porta que se abria lentamente. Meu coração se apertou ao vê-la. Ela estava linda, radiante. A felicidade era evidente em seu rosto, seu sorriso. Ela passou a minha frente eu senti o nó se formar em minha garganta. A dor em meu peito era terrível.


Mino

O dia do casamento chegou. Eu pensei em não ir. Inventar alguma desculpa para justificar minha ausência, mas eles vieram me convidar pessoalmente e eu não pude negar. Não conseguiria negar nada a Seiya.

Estava naquela igreja, vendo Seiya andar de um lado para o outro, ansioso. Como eu queria estar no lugar de Saori. A marcha nupcial começou a tocar e ela entrou na igreja. Estava deslumbrante. A felicidade era evidente em seu semblante. Saori caminhou até o altar e ela e Seiya se ajoelharam em frente ao padre.

Eu nunca rezei para que uma missa chegasse ao fim, mas naquele dia... Eu só queria fugir dali. Quando o padre perguntou se alguém tinha algo contra aquele casamento... Eu tive que me controlar para me manter em silêncio.

Vi Seiya se aproximar dela, erguer-lhe o véu e beijá-la delicadamente. Meus olhos arderam, as lágrimas querendo escapar e eu lutando para contê-las. Os dois cumprimentaram os padrinhos e saíram da igreja lentamente. Metade do meu tormento tinha passado. Faltava a festa. Os pensamentos passavam pela minha cabeça: Ir ou não a essa festa? Fui, pois o contrário poderia magoar os noivos, embora eu pensasse que eles nem dariam pela minha falta.

Quem no coração

Abrigou a tristeza de ver

Tudo isso se perder

E na solidão

Procurou um caminho a seguiu

Já descrente de um dia feliz


Jabu

A mansão Kido estava toda enfeitada. O jardim havia sido aparado. Um bufê havia sido contratado. Por todos os cantos da Mansão havia arranjos de flores: no salão de entrada, onde os convidados eram recepcionados; na sala de jantar e na mesa de centro. Mas a festa acontecera no jardim, na sala de jantar não teria espaço suficiente para todos os convidados.

Apesar de milionária, Saori não se preocupou em convidar a elite japonesa. Não queria fazer média com ninguém. Aquele era um momento importante e apenas os amigos do casal tinham sido convidados: os casais Shiryu e Shunrei; Hyoga e Eire; Aioria e Marin; Ikki e Seika; Miro e Sheena; os demais cavaleiros de ouro, os cavaleiros prata, de aço e de bronze, algumas amigas de colégio de Saori e alguns amigos de Seiya também. O jantar estava maravilhoso, eu não posso negar.

Os noivos não poderiam estar mais felizes. Desdobravam-se para dar atenção a todos os que estavam presentes. Os olhares apaixonados e ansiosos que trocavam constantemente eram percebidos por todos. Eu me sentia totalmente deslocado naquele lugar. Sim, com certeza aqueles dois seriam felizes e nada poderia separá-los. Eu não conseguia evitar sentir inveja de toda aquela felicidade.


Mino

Eu pensava numa forma de sair daquela festa sem que dessem por minha falta, mas não tive coragem. Seiya é meu melhor amigo e eu sabia que essa atitude o magoaria, por isso me controlei. Eire e June faziam de tudo para animar-me. Sabiam o quanto estava sendo difícil presenciar tudo aquilo.

Finalmente a festa chegava ao fim. Os noivos preparavam-se para viagem de lua-de-mel. Saori anunciou que jogaria o buquê e as solteiras presentes se aglomeraram atrás dela, todas ansiosas. Eu fiquei de lado, encostada em uma pilastra, apenas observando toda aquela comoção, sem realmente estar prestando atenção ao que estava a minha volta quando Saori jogou o buquê. As jovens se empurravam numa tentativa de pegá-lo, mas... Ele caiu justamente em meus braços. Eu levei um susto. Estava tão distraída com meus pensamentos que nem o vi vindo em minha direção. Ergui os olhos e vi as garotas olhando pra mim desanimadas.

Quem chorou, chorou

E tanto que seu pranto já secou


Jabu

Eu queria fugir daquele lugar! Desaparecer! Mas eu tinha que me controlar... Pelo menos naquele momento. Sei que é um sentimento mesquinho, mas a felicidade deles me machucava profundamente. Eu passei a minha vida almejando apenas um pouco da afeição dela... Era tão doloroso presenciar toda aquela alegria...

Finalmente a festa estava chegando ao fim. Saori e Seiya iriam viajar em lua-de-mel. Ela se preparava para jogar o buquê. Eu vi as garotas se aglomerarem no meio do jardim, atrás de Saori. Era uma cena... No mínimo cômica. Algo tinha que me fazer rir naquela noite. Aquelas garotas praticamente se estapeavam por causa de um simples buquê. Como se a simples idéia de pegá-lo fosse o suficiente para arrumar casamento pra alguém!

Encostei-me a uma árvore, os braços cruzados sobre o peito, e fiquei a observar aquela cena... Sem comentários! Então, meus olhos pousaram sobre uma garota que estava encostada a uma pilastra, alheia a tudo o que estava acontecendo a sua volta. Mino... Pela primeira vez naquela noite eu não me senti sozinho.

É estranho, não? Eu sabia dos sentimentos dela por Seiya. Quem não sabia? E sabia também o que ela devia estar sofrendo e eu era solidário a ela nesse sofrimento. Vi quando Saori jogou o buquê e este veio, graciosamente pousar nos braços dela que sequer fez um único esforço para pegá-lo. As outras garotas estavam frustradas. Tanto escândalo pra nada.

- Mino será a próxima a se casar! – disse Seiya sorridente. Mino parecia perdida. Vi quando Saori com um sorriso nos lábios caminhou até ela. Por um segundo eu fiquei apreensivo. Qual seria a reação de Mino à aproximação de Saori?

Saori a abraçou carinhosamente, depois de alguns instantes de hesitação e Mino retribuiu o abraço.

Eu admirei aquela garota. Se ela amasse Seiya tanto quanto eu amava Saori, sabia exatamente o que ela estava sentindo. E mesmo com toda essa dor indescritível... Mesmo assim ela aceitou o abraço de sua "rival" e mais, retribuiu-o.

Seiya se aproximou das duas quando Saori se afastou. Ele abraçou Mino e beijou-a na testa. Seiya e Saori deram-se as mãos e se distanciaram... E estranhamente... Meus olhos não mais acompanhavam Saori. Eu estava admirado com Mino.

Ela ficou ainda alguns instantes observando os noivos se afastarem. Então... Ela baixou os olhos para o buquê em suas mãos. Eu vi quando uma lágrima escorreu por seu rosto... Mas... Um doce sorriso enfeitava seus lábios. Aquele olhar... Havia esperança naquele rosto.


Mino

- Mino será a próxima a se casar! – ouvi Seiya dizer. Eu olhei para Saori que sorriu, se aproximando de mim. Nos fitamos por alguns instantes e ela me abraçou. Eu estava nervosa. Sentimentos conflitantes brigavam em meu peito. Saori sabia de meus sentimentos por Seiya, quem não sabia? Mas nunca me tratou mal. No começo aquela atitude me incomodava. Parecia arrogância. Como se ela tivesse certeza de que eu não tinha a menor chance com ele. Mas aos poucos fui percebendo que não era nada daquilo.

Realmente, ela tinha todos os motivos para acreditar que eu não era páreo pra ela na disputa pelo amor de Seiya, ele provara inúmeras vezes que a amava incondicionalmente... Mas o que eu sentia é que ela entendia meus sentimentos e até se culpava pela minha dor. Nunca consegui ter raiva dela.

Fiquei rígida a princípio, mas acabei por retribuir o abraço. Engraçado, mas aquele abraço me reconfortou. Mesmo amando Seiya, sabendo que aquela mulher o tinha conquistado... Eu não conseguia vê-la como minha rival.

- Espero que seja feliz, Mino. – Saori disse ao meu ouvido e afastou-se para encarar-me. Eu senti meus olhos encherem de lágrimas, mas sorri. Seiya aproximou-se de nós, abraçou-me apertado e deu-me um beijo na testa. Afastou-se de mim e sorriu. Ele olhou para Saori e estendeu a mão. De mãos dadas se distanciaram. Estavam de partida.

Olhei para o buquê em minhas mãos, uma lágrima deslizou pelo meu rosto, mas não pude me impedir de sorrir. Senti uma sensação de paz naquele momento como nunca sentira antes. Eu não sei explicar... Mas foi um sentimento muito bom... Senti que estava livre...

Quem depois voltou

Ao amor, ao sorriso e à flor

Então tudo encontrou

E a própria dor

Ensinou o caminho do amor

E a tristeza acabou


Oi Pessoal!!! Espero que gostem desta fic! Eu a dividi em três capítulos e pretendo postá-la completamente até o Natal! Gostaria de agradecer a Andréa que me deu algumas dicas para melhorá-la: Obrigada Andréa!!!! Espero que goste do resultado!!!! E aos que a lerem, espero que gostem e comentem! Tchau e até o próximo capítulo.

Obs: a Música deste capítulo é "Meditação", de Tom Jobim.