No capítulo anterior...

Ambos viraram-se simetricamente para trás ao ouvir passos se aproximando. No fim do terraço duas sombras moviam-se na escuridão.

- São Rorschach e Questão? – um deles perguntou.

- Quem quer saber? – Questão retorquiu.

As duas sombras alcançaram a luz e eles puderam se encarar. Roy e Zuko sorriram maliciosamente para os dois humanos. Seriam presas fáceis.

"O peão é a causa mais freqüente da derrota."

- Wilhelm Steinitz (Primeiro campeão mundial de Xadrez)

System Future

Capítulo IX – Fim da Linha

- Vocês virão conosco – Roy erguia a mão enquanto dizia.

Antes que pudessem ter qualquer reação contrária já estavam se abaixando para desviar do ataque de fogo vindo da mão do homem. Assim que as chamas se alastraram ergueram-se pasmos e trocaram olhares. Como ele fizera aquilo?

- Rorschach!

O homem de sobretudo castanho afirmou com um aceno e tirou o chapéu da cabeça, guardando-o sob o terno, antes de começar a correr em direção a varanda do terraço. Não costumava fugir de uma luta, mas se aqueles eram os shinobis dos quais falavam nos últimos dias, sabia que não poderia vencê-los. Tirou o lança-arpéu de dentro do sobretudo e atirou no prédio ao lado, jogando-se ao sentir os braços de Questão em sua cintura.

- Preciso de um brinquedinho desses – comentou o mascarado de cabelos negros.

Repentinamente o arpéu soltou-se e eles caíram. Ainda puderam olhar para cima antes de atingir o solo: Zuko estava com os pés grudados na parede do prédio e segurava o arpéu entre as mãos. Enquanto caiam, Questão agarrou-se a uma janela aberta e Rorschach segurou suas pernas. As mãos dele arrastaram no parapeito com a força em que sua queda foi parada, evitando desabar de uma altura de cinco andares. Mas ainda estavam dependurados na janela de alguém e o homem de sobretudo azul não agüentaria por muito tempo o peso do companheiro.

- Consegue subir em mim e alcançar a janela? – murmurou com os dentes trincados, usando toda a sua força para não deixar que caíssem.

Rorschach soltou uma das mãos e agarrou a barra da calça do outro sobre o sobretudo, esperando que a roupa não rasgasse quando começasse a subir. Puxou e pôde sentir que Questão deslizou para baixo, mas não freou a subida; apoiou o pé na parede e impulsionou o corpo com as mãos nos ombros dele. Com isso Questão acabou soltando uma das mãos e agora balançava com Rorschach apoiando-se em seu ombro e tentando entrar pela janela. Munindo-se do resto de força que ainda tinha, empurrou-o para dentro com a mão livre e esperou que voltasse para buscá-lo.

Do outro lado da rua via o mais velho dos dois caminhando tranqüilamente pela calçada, com a cabeça erguida para vê-lo. Enquanto perguntava-se onde estaria o outro, olhou para a janela e pôde vê-lo andando verticalmente pela parede do prédio, vindo em sua direção.

As mãos de Rorschach agarraram seu pulso e ele o puxou para cima de uma vez, fazendo os dois caírem desajeitados no assoalho.

- Por que demorou tanto?

Ele mostrou-lhe o lança-arpéu. Havia conseguido manter ele na mão enquanto caiam e tinha reposto o arpéu e a corrente no lugar. O outro motivo de seu atraso estava desmaiado no chão ao meio de cacos de vidro de um vaso de flores (provavelmente o dono do apartamento).

- Vamos, Zuko! – ouviram um deles gritar lá fora.

- Não há pressa, eles não vão a lugar algum – o outro respondeu.

A voz dele soava mais próxima e logo sua cabeça apareceu na janela, procurando pelos dois homens de máscara que estavam escondidos dentro de um armário apertado. Zuko pulou para dentro do apartamento e observou por alguns instantes o homem caído no chão, depois indo até a porta para tentar abri-la e constatar que estava trancada. Eles ainda estavam ali em algum lugar. Voltou-se mais uma vez ao apartamento, percorrendo-o em passos lentos e silenciosos, abrindo portas, acendendo luzes e olhando atrás de objetos.

A lâmpada sobre as cabeças de Questão e Rorschach acendeu de repente e os dois sobressaltaram-se em se mexer no cubículo, procurando alguma coisa que pudesse servir de arma. A mão de Rorschach acabou achando um pedaço de madeira e ele ergueu-o desajeitado no espaço pequeno, pouco antes da porta correr para o lado. Mas não havia ninguém ali. Os dois não eram mais amadores, conheciam aquele truque; ficaram quietos, esperando. Zuko apareceu e tentou agarrá-los, e nesse momento Rorschach baixou a arma em sua cabeça com força e o fez recuar, zonzo.

Saíram do pequeno armário, com Rorschach ainda acertando o rapaz com o que tinha em mãos em ritmo frenético. Zuko agarrou o porrete em uma dessas investidas e o tomou das mãos do outro com um puxão. Com o indicador e o médio juntos, empurrou o ar em direção ao peito do Mascado e fogo brotou da palma de sua mão, atingindo-o em cheio. Foi quando recebeu uma nova pancada na cabeça, mais forte, e foi ao chão. Os golpes anteriores já o haviam deixado atordoado, e agora lutava para não desmaiar.

Levantou a tempo de ver um deles arrombar a porta, tirando o sobretudo para apagar o fogo na roupa do segundo, e saírem correndo pelo corredor. Disparou atrás deles; o estômago e cabeça latejando. Não devia tê-los subestimado tanto.

- Por aqui, vamos! – Questão exclamou, empurrando-o para dentro de uma porta aberta e a fechando em seguida.

Olharam em volta quando a luz acendeu. Era uma lavanderia, havia roupas secas por todos os lados e algumas delas deveriam caber neles. A idéia de trocar de roupa logo foi descartada – era absurda, nenhum dos dois queria tirar a máscara na frente do outro.

- Janela – disse Rorschach, caminhando até ela para abrí-la e tirar o lança-arpéu do encaixe no cinto, no entanto, antes de apertar o gatinho, Questão tomou-o de si e atirou, passando um braço sob os seus e prendendo seu peito.

- Você não vai conseguir segurar nós dois depois de ter sido atingido – explicou.

Lançou-se pela janela com uma mão segurando Rorschach e a outra ao lança-arpéu. Não fora uma boa idéia, ele era mais pesado do que imaginava e o suor sob seu braço fazia seus dedos escorregarem. Se continuasse assim, eles acabariam... caindo.

Antes mesmo de completar a frase em mente uma rajada de fogo invadiu o céu a sua frente. Estendeu os pés e fechou os olhos, como se isso pudesse protegê-lo, e continuou no meio do fogo, suando e agarrando o tecido escorregadio do sobretudo de Rorschach enquanto ele tentava segurar-se em seu braço. Ouviu-o gemer de dor, talvez por estar sendo queimado novamente, e então eles caíram, desta vez sem nada para se segurar. Sacos de lixo apararam as suas quedas, se não fosse por eles teriam sido esmagados no chão.

- Eles vão voltar daqui a pouco. Tem uma passagem nesse beco, venha comigo – levantava-se ofegante enquanto falava.

Rorschach não o seguiu. Voltou-se para ele rapidamente e encontrou-o com a mão sobre um tipo de arma branca que estava cravada em seu peito ensangüentado. As roupas chamuscadas também revelavam a pele avermelhada pela exposição ao fogo. Deviam tê-lo acertado momentos antes da queda.

Correu para ajudá-lo, dando tapas em seu rosto para fazê-lo voltar a si, então passou seu braço em volta dos ombros e saiu carregando-o até o fim do beco. Atrás de vários sacos de lixo e tábuas, acharam uma passagem estreita. Ao passar por ela estavam nos fundos de um condomínio de luxo, espremidos entre duas paredes. Saíram aos tropeços, fecharam a passagem e Questão continuou a arrastar o companheiro ferido para dentro do prédio. Ao chegar à porta tateou os bolsos e tirou um cartão, passando-o sobre o identificador para a porta abrir para eles. Caminharam mais tranqüilos ao elevador no canto; tinham sorte de ser tarde da noite e não haver mais ninguém fora de seus apartamentos.

O elevador parou em um dos andares mais altos e eles saíram para o corredor. Quando alcançaram a terceira porta, Questão tirou a luva e pôs a mão na placa ao lado com um desenho indicativo, fazendo aparecer a mensagem "Bem-vindo, senhor...", o resto – que provavelmente continha seu nome – ele cobriu com o braço e entrou arrastando Rorschach. À medida que passavam ele derrubava porta-retratos e escondia a correspondência como podia. Já havia arriscado demais trazendo-o até seu apartamento, e provavelmente ele descobriria seu nome depois, se o quisesse, mas tentaria evitar que acontecesse naquele momento.

Sentou Rorschach em uma poltrona e desamarrou seu sobretudo queimado, tirando-o com a ajuda dele. Fez o mesmo com o terno de risca-giz roxo, tirou o cachecol e abriu a camisa branca que já estava amarelada, rasgada e com alguns botões faltando. Havia uma queimadura feia no peito e o sangue escorria.

- Nossa, isso está com uma cara péssima – recuou a mão quando o homem gemeu ao seu toque. – Vou tentar fazer o que posso, mas esses pêlos vão atrapalhar bastante – alisou o peito dele. – Espere quieto aqui um instante, vou ver se os vizinhos têm algum depilador pra me emprestar.

Ele levantou-se e saiu, apertando algo no cinto que o envolveu com uma fumaça amarela. Rorschach poderia jurar que os cabelos dele estavam ruivos quando saiu do apartamento. Assim que não havia mais perigo dele voltar, estendeu a mão e apanhou um dos porta-retratos que ele tinha derrubado. Odiava admitir, mas estava curioso para saber quem era aquele homem. Olhou a foto e sob a máscara seus olhos arregalaram. Mas aquele... Aquele ruivo de olhos claros e expressão dura recebendo um prêmio jornalístico... Era Vic Sage! O apresentador do único telejornal que assistia, o último jornalista que não fora comprado pelos políticos e fazia denuncias perigosas em seus programas! Ele era o Questão?

x-X-x

Foi diretamente para a cozinha ao acordar, como fazia todas as manhãs nas últimas semanas. O cheiro de café invadia suas narinas de sentido olfativo apurado enquanto se aproximava. Akabane estava sentado à mesa com uma xícara fumegante; ele encarava fixamente o computador em sua mão e às vezes dava alguma ordem ao persocon ao lado. O moreno somente notou sua presença quando puxou uma cadeira e sentou ao seu lado.

- O que está fazendo? – perguntou.

- Vendo os custos que terei que cortar para permanecer alguns meses no apartamento, o suficiente para arrumar um novo emprego – ele explicou, lançando um olhar de relance ao segundo. – Agora que Pantera-kun está nos ajudando, poderá voltar para seu apartamento em poucas semanas.

Scar murmurou alguma confirmação desdenhosa e apanhou a carne mal-passada que estava em um prato mais à frente, puxando-a para perto.

- Alguma idéia de onde vai trabalhar agora?

- Não, nenhuma ainda.

Mais uma confirmação desdenhosa, enquanto pegava os talheres. Encarou em silêncio a Akabane por um longo tempo. Ele prendera os cabelos negros, deixando mais em evidência seus olhos fúcsia puxados. Achava que ele ficava mais ameaçador daquela forma do que com o sobretudo negro e chapéu.

- Eu sinto muito pela sua demissão.

O tom sempre irônico e pomposo de Scar não permitia que aquele pedido de desculpas fosse levado a sério – mais parecia estar debochando.

- Obrigado, Scar-san. – Baixou o computador em mãos e voltou-se ao moreno. – Foi uma temporada divertida, apesar dos contratempos.

- Sim, muito divertida, Jackal – sorriu.

Então, como se tivessem ensaiado ou o fizessem todos os dias, como se fosse algo rotineiro e sem importância, inclinaram-se e se beijaram.

x-X-x

O sol estava alto sobre sua cabeça, provavelmente era meio-dia. Mesmo na sombra fazia um calor infernal, e nem os ventos que vinham em intervalos longos apaziguavam aquela quentura. Podia imaginar, com um sorriso frouxo nos lábios, os resmungos do companheiro diante daquele calor.

- Suigetsu, seu idiota, onde você se meteu? – se perguntava em voz alta.

Avançava pelas sombras das árvores à procura de algum sinal do chakra do rapaz. Assim que se separaram, Karin encontrara uma passagem pública e entrara por ela sem olhar onde daria. Agora andava a esmo por alguma fronteira entre bases ou países shinobis, buscando além do chakra de Suigetsu alguma fonte de energia para carregar o persocon e pedir-lhe sua localização.

A ruiva jogou-se cansada à sombra, escorada ao tronco de uma árvore. Descansaria alguns minutos antes de voltar a caminhar. Fechou os olhos e pôs-se a se concentrar no chakra de Suigetsu. Talvez se procurasse ali, parada e devidamente concentrada, pudesse encontrar algum rastro dele. Ao invés disso, achou uma presença completamente diferente se aproximando em alta velocidade. Ficou mais tranqüila em ver que não o reconhecia, ao menos não era Sasuke, Orochimaru, ou seus subordinados... A menos que tivessem pessoal novo.

Levantou e preparava-se para correr quando a pessoa em questão saltou a sua frente, barrando à passagem. Era um menino de cabelos castanhos, usando sobretudo Akatsuki.

Karin realizou uma seqüência de selos e murmurou "Kai!". Sentiu uma pontada na nuca, mas nada que não pudesse suportar. Genjutsus não a pegavam tão facilmente.

- Não esperava que um genjutsu rank C funcionasse, de qualquer forma.

Virou-se para a árvore onde estava sentada há pouco. Aquela figura de sobretudo surgia da sombra, carregando uma expressão fria na face.

- O que você quer? – perguntou a Kyo.

- Você é meu alvo.

O menino desfez-se em pombas brancas que subiram pelo céu e desapareceram. Karin realizou a mesma seqüência de antes e tentou cancelar o genjutsu, mas não havia alterações no fluxo de chakra que sentia em volta de si.

- Não será assim tão fácil escapar, Karin-san.

De volta à realidade, Kiriyama retirava a seringa da nuca da ruiva e lançava um olhar rápido ao menino de frente para a ela. De fato, escapar não era tão fácil e ela nunca o fizera. Teriam de transportá-la até a base antes que o soro injetado, que confundia suas habilidades de rastreamento, tivesse o efeito neutralizado. Kyo sorriu para Kiriyama e lhe mostrou o polegar em sinal de que estava tudo bem.

- Foi mais fácil do que eu esperava – disse-lhe. – Usar o fato dela não poder sentir sua presença foi uma ótima idéia, Kiriyama.

Ele não respondeu, apenas jogou a ruiva sobre o ombro e saiu na direção oposta, deixando o rapaz mais jovem para trás.

x-X-x

A Hyuuga voltara de uma pequena missão fora da base, que durou pouco mais de dois dias, e agora sentava-se em um sofá movimentando arquivos na tela que se projetava à sua frente. Pegara novas informações sobre Lela no computador de seu pai e só agora tinha tempo de analisá-las para repassar mais tarde ao Aburame que lhe confidenciara aquela missão.

Cada vez mais acreditava que ele estava certo sobre a garota ser parte da Akatsuki. Encontrara registros de vídeos amadores onde um integrante daquela organização, incrivelmente semelhante a Lela, atacava alguns Ninjas. A única coisa que a fazia ter dúvidas era pela garota não usar taijutsu Hyuuga, mas sim suiton. É claro que isso podia dever-se ao fato dela não ter treinado no clã e então não conhecer tais técnicas.

- Não devia ficar mexendo no passados dos outros, Hanabi-chan.

Ergueu-se e se voltou rapidamente para trás. Lela a olhava de detrás do sofá, com o cenho franzido expondo sua irritação.

- O que você está fazendo aqui?

Ela contornou o sofá e desligou as imagens com um clique no teclado sobre a mesinha-de-centro, e só então se dirigiu à menina.

- Eu que deveria fazer as perguntas. Por quê está tão interessada em minha história?

- Você é uma Hyuuga que viveu fora do clã; não é uma coisa muito comum. Como sucessora dos Hyuuga, devo ficar a par dessas coisas para não permitir que se repitam quando eu estiver liderando. – Ouvindo em voz alta era realmente uma desculpa razoável, mas a moça não pareceu convencida.

- Sabe o que eu acho? – Lela olhou-a. – Acho que está suspeitando de mim. É isso, não é? – avançou dois passos em direção a ela. – Você e aquele garoto estranho do time de Kiba... Andam de me espionando?

- Isso é absurdo.

Lela tocou o indicador no centro da testa da menina, ainda encarando-a de forma séria.

- É bom que seja mesmo – aproximou-se um pouco mais. – Se quer o seu priminho vivo, melhor que isso seja verdade.

- Primo? Do que você está falando? – agarrou-a pela gola da blusa e a sacudiu.

- Não sabe? Quais Hyuuga estão fora da base nesse momento? Quantos deles são seus primos?

Pensou rapidamente em todos os nomes que podia se lembrar. Havia poucos fora da base, e menos ainda que eram primos... Céus, Neji!

- Já lembrou? – perguntou diante da expressão de pânico na face da menor. – Ótimo. Agora, se quer aquele garoto respirando, é melhor ficar fora do meu caminho, Hanabi-chan.

A Akatsuki soltou-se das mãos dela e virou-se para pegar o teclado sobre a mesinha-de-centro, quebrando-o entre as mãos. O jogou no chão da sala e saiu, sem virar-se para encará-la uma última vez. Quando a porta tornou a fechar, Hanabi largou-se no sofá com a cabeça entre as mãos.

x-X-x

Abriu os olhos devagar e procurou imediatamente lembrar-se do que acontecera. Missão, captura, luta, derrota... Claro, por isso sentia pontos por todo o corpo latejarem dolorosamente.

- Você está dormindo há dias.

Virou a cabeça sobre o travesseiro para achar sua parceira escorada à janela aberta; não usava o sobretudo Akatsuki e o sol contra a sua pele branca e os cabelos negros causava um efeito estonteante.

- Estava esperando eu acordar? Sabia que era gamada em mim – riu-se Pierre, enquanto levantava-se com dificuldade.

- Poupe sua energia com piadinhas e guarde-as para as próximas missões. Não quero passar a vergonha de te carregar por quilômetros mais uma vez.

O rapaz ficou em silêncio, encarando-a escorado ao travesseiro com certo rancor no olhar. Aiko não se deixou abater com o efeito de suas palavras no garoto, manteve o olhar frio sobre ele.

- Desculpe se não estou a altura de vossa magnificência – ironizou.

- Você é um imbecil.

- Hey! – projetou o corpo para frente. – Não fale assim comi...

- Eu ainda não terminei de falar – ela disse, erguendo a mão para censurá-lo. – Se você lutasse com metade da vontade que empenha em tentar ser engraçado, não teria passado por aquela cena ridícula. Isso aqui não é brincadeira, tínhamos uma missão importante. Sabe o que teria acontecido caso não os detivéssemos? Eles encontrariam Sasuke. Lembra do que aconteceu da última vez que houve luta shinobi em território humano? Das inúmeras mortes e transtornos? E não seria apenas isso. Se Sasuke voltar para a Folha, ele irá com certeza procurar um meio de atacar Itachi-san e isso desencadearia uma guerra antecipada. Por muito pouco a sua infantilidade não nos custou isso. Para onde você está indo?

Pierre havia levantado e despido as roupas do da ala hospitalar para vestir as suas sobre uma mesa enquanto ela falava, e agora tentava abrir a porta para sair do quarto.

- Treinar.

- Ainda não está em condições para isso. Seus fluxos de chakra não abriram completamente, se forçar eles vão inchar de novo.

- Que se foda toda essa merda. Onde está aquele Hyuuga maldito? – ainda forçava a porta com os dedos, sem perceber que a moça a sua frente tinha o controle remoto nas mãos.

- Preso no subsolo. Pierre, volte para a cama, a porta não vai abrir.

- Porra, eu não entendo você. Primeiro quer que eu treine, depois quer que eu volte pra cama. Decida-se!

Fechou os olhos e suspirou longamente. De todos os alunos de sua turma, Hidan-san tinha que escolher alguém tão imbecil quanto ele, não é? Kakuzu-sensei estava certo, eles eram mesmo impossíveis, estúpidos e realmente cômicos.

x-X-x

Sentava-se no enorme e confortável sofá do apartamento com os pés sobre a mesinha-de-centro. No colo, sobre um travesseiro, trazia um prato de comida que havia encontrado na geladeira. Bem, ele havia dito para ficar a vontade, não é? E além do mais, chegara à conclusão de que ele não se preocuparia com comida depois do café da manhã que preparara para os dois, mas que alimentaria cinco pessoas sem maiores problemas. Era tudo um enorme exagero. O quarto de hóspedes maior que o seu apartamento inteiro, a televisão gigantesca, os banheiros do tamanho de um quarto normal, as roupas de marca que ele lhe havia emprestado para passar a noite ali (tinha certeza que a cueca que ele lhe dera alegando nunca ter usado e ainda tinha a etiqueta custava mais do que seu uniforme completo). Parecia absurdo, mas por outro lado aquele era o apartamento de um jornalista polêmico e premiado, deveria ser luxuoso para as visitas freqüentes pensarem que não passava de mais um rico esnobe da televisão.

Seus pensamentos sobre a linha entre Vic Sage e Questão foi quebrada quando a porta do apartamento abriu e ele entrou, apertando um botão no cinto para os cabelos ficarem negros e a máscara fixar-se em sua pele.

- Aqui está. – Questão tirou o lança-arpéu de Rorschach da bolsa e jogou-o para ele. Haviam esquecido no beco na noite anterior e, para evitar que o segundo saísse e fosse atacado naquelas condições, prometera que traria de volta quando voltasse. – Também trouxe alguns remédios para a infecção dessa ferida. Deixe-me ver isso.

Aproximou-se, sentando-se na mesinha-de-centro ao lado dos pés dele para esperar que tirasse o prato do colo e desamarrasse as bandagens em volta do peito. Os pontos que dera na noite anterior ainda estavam firmes, mas a pele em volta tinha uma coloração azulada e apresentava um leve inchaço – somente as queimaduras tinham um melhor aspecto. Retirou as luvas para começar a tratar melhor daquela ferida.

- Não houve problema enquanto estive fora? – perguntou. – Eles não voltaram?

- Não.

- Falei com L e Haruma. Eles acham que devemos ir para aquele apartamento que haviam alugado para nossos encontros, pro caso deles terem nos seguido e estarem vigiando.

- Você pode ir. Não tirei a máscara, não tem perigo.

- Você é quem sabe.

Ficaram em silêncio por alguns vários minutos, onde Questão concentrava-se no que fazia nas costuras e no inchaço em volta.

- Me disse ontem que o Coruja se aposentou por livre e espontânea vontade – começou devagar, como se comentasse sobre o clima –, mas por quê?

- Dan era mole. Só um homem com fantasia. Sem perspectiva, sem força de vontade. Não matava.

- Dan? Esse era o nome dele?

- Daniel.

- Foi ele quem morreu no assalto ao banco e fez o lança-arpéu para você, não é? Está tentando vingá-lo?

- O Coruja foi um bom amigo. – Era uma frase muito estranha de se ouvir da boca de Rorschach.

- Eu admirava vocês dois, como dupla. Lembro que vendiam bonequinhos no começo, quando vocês ficaram muito populares. Achavam que eram marketing da polícia – riu da ironia. – Isso vai soar meio idiota, mas você foi um dos caras que influenciou na escolha do meu uniforme. Quero dizer, sempre tive vontade de fazer algo por essa cidade, mas achei que soava ridículo colocar uma fantasia e sair por aí prendendo bandidos. Então vocês apareceram e pensei: "Se eles podem, por que eu também não poderia?". E sobretudo não é bem uma fantasia, se você pensar nisso.

- Fala como se eu fosse velho.

- Não queria ofender. – Terminara de tratar da ferida e recolocava as bandagens. – Você e o Coruja eram bem íntimos, não é? Você sabe o nome dele...

- Não da forma que você está pensando. Sem rodeios. Aonde quer chegar?

- Sua identidade. Ele conhecia? Alguém conhece?

- Não. Ninguém.

Questão abriu a boca para falar algo, mas nesse momento um bip chegou aos seus ouvidos e a televisão ligou. Voltaram-se rapidamente para ela, onde aparecia a mensagem: "O programa começará em um minuto" – o tempo diminuía como um cronômetro.

- Que programa?

- O programa de Sage – sentou no sofá ao lado de Rorschach. – Vic Sage. Espere para ver o que terá hoje.

Ouviram a vinheta de abertura e aquela figura alta de cabelos alaranjados bem penteados e olhos azuis surgia detrás de uma bancada, olhando fixamente para frente com expressão dura.

- Boa tarde, cidadãos New York. Ou melhor, uma péssima tarde, com toda a certeza. Um mar de lama! Essa é a melhor definição para a administração atual dessa metrópole. No programa passado falamos sobre a corrupção na polícia e a nova Lei Keene contra os mascarados, e nesse programa falaremos sobre um dos maiores magnatas deste país: Emiya Shiro. – Aparecia ao lado dele algumas imagens do homem citado. – Não é a primeira vez que falamos dele nesse programa. Lembram-se dos escândalos a respeito de humanóides com vontade própria? Emiya chegou a ser detido por exatas dezesseis violações de leis, dentre elas: fraude, homicídio, desvio de dinheiro, suborno, porte ilegal de arma, etc. Mas, como sabemos, ninguém rico o suficiente para subornar as autoridades é preso; a lei vale apenas para os pobres e honestos. Emiya escapou ileso com seus advogados alegando insanidade mental. Sinceramente, quando um maluco conseguir construir um império bilionário podemos esperar que chova dinheiro. E como se libertarem um suposto doente mental homicida já não fosse algo absurdo, vocês acham mesmo que ele não construiu os tais humanóides? Reflitam com mais cuidado sobre esse rostinho de bom moço depois dessas imagens.

A imagem de Vic foi transferida para um pequeno holograma fora da tela, e esta foi tomada pelas imagens de Shiro (limpando o sangue que escorria do lábio de Saber, reprogramando-a com fios nas entradas em sua nuca, ao fundo de imagens onde a jovem atacava shinobis...). Quando as imagens começaram a se repetir, Vic voltou ao primeiro plano e os vídeos foram para o canto.

- Essa moça bonita que acompanha Emiya nos vídeos que recuperamos de câmeras de segurança se chama Saber, e ela é um dos robôs humanóides com sentimentos que ele conseguiu produzir. Ela não é a única, existem outros seis. Mas Emiya não é o principal fabricante dessas aberrações, senhoras e senhores. Um mar de lama, com toda a certeza! E o presidente se preocupando em criar leis para abolir o anonimato dos bem-feitores mascarados enquanto esses verdadeiros pervertidos estão à solta, andando livremente com os rostos a mostra. Elegemos alguém tão estúpido assim ou ele só está protegendo seus comparsas? Esses malditos japoneses saem de seu país para vim roubar no nosso e as autoridades abrem as pernas para eles? O que aconteceu com o patriotismo? Os Kiriyama vêm trazendo a ditadura para o Japão e são praticamente donos daquele pedaço de terra, então esses magnatas obscenos migram para nosso país e começam a roubar o nosso dinheiro e importar tecnologia para criar esses assassinos robóticos, ou não tão robóticos assim. Não, Emiya Shiro não é o único japonês em solo americano usando dos novos brinquedinhos, também estão...

A tela apagou por alguns instantes e no momento seguinte aparecia a mensagem "Fora do Ar".

- O quê? – Questão levantou-se em sobressalto.

Houve um ruído de passos ligeiros dentro do apartamento e a janela foi aberta por alguma coisa ou alguém. Questão correu para lá e debruçou-se no parapeito, mas só via algumas pessoas andando pela rua. Socou a parede em frustração e voltou-se a Rorschach.

- Tem que sair daqui agora, estavam nos vigiando. Merda, como não reparei nisso? O alarme devia ter soado, não era para entrar pessoas invisíveis no apartamento! – andava de um lado para o outro, desligando telefones e computadores. – Rorschach, pegue suas coisas e vá à frente. Nos encontramos na meia-noite de hoje com L e Haruma. Aqui – tirou umas chaves do bolso e jogou para ele. – Sabe dirigir, não é? É um carro azul, está nos fundos do estacionamento sob uma lona preta.

Ele levantou-se devagar, ainda sentindo dores no peito, e saiu para apanhar as roupas que deixara no quarto de hospedes. Podiam ter descoberto a identidade de Questão, mas ainda não conheciam o seu rosto. Ainda havia a possibilidade deles estarem atrás de Sage pelo que ele vem dizendo em seus programas, e não por saberem que usa uma máscara à noite. Não é qualquer um que burla a censura e faz aquele tipo de comentário sobre as autoridades... De qualquer forma, se o vissem ali iriam descobrir que Vic Sage era mais do que um jornalista encrenqueiro. Aquele que os vigiava, se não fosse um dos shinobis da noite anterior, já deveria saber disso e grandes problemas esperavam por Questão.

x-X-x

Os sete estavam reunidos em volta da mesa observando quietos às imagens completas do programa que haviam confiscado. Mais alguns segundos e aquele crápula realmente diria seus nomes... Como ele descobriu aquilo? Eram informações ultra-secretas, nem mesmo o presidente deveria saber da existência dos Exterminadores. Agora toda a população tomaria conhecimento de uma pequena parcela de seus planos o que, por mais insignificante que pudesse parecer, não devia ser ignorado.

- Ele deve ser exterminado – Kotomine disse, quebrando o pesado silêncio na sala. – Lancer pode cuidar dele sem problemas. – Sorriu e ergueu a mão, onde brilhava um símbolo em azul.

- Não, não vamos fazer nada tão drástico – censurou-o Rin; sentava-se na cabeceira da mesa. – Esse Vic Sage só precisa ficar fora do ar por algum tempo. Vamos falar com ele e explicar como as coisas funcionam aqui.

- É, é uma boa idéia. – Todos se voltaram a Shiro quando este falou, deixando o rapaz desconfortável.

- Para começar, isso não teria acontecido se você tivesse deixado Saber cuidar de Questão e Rorschach. Tenho certeza que os dois enviaram as informações para Sage, ele é muito popular entre esses paranóicos. Parece que existe alguém na cidade que acredita nos dois malucos, não é?

Enquanto Rin falava Archer apareceu ao seu lado, voltado para ela.

- Por quê me chamou de volta?

- Vic Sage está interferindo em nossos planos.

- Eu sei, ele e Questão são a mesma pessoa.

Houve um momento de exaltação dos presentes seguido de constrangedor silêncio – todos voltavam a encarar Shiro.

- Já que é assim, não precisa me trazer Questão, apenas capture Rorschach. Vamos aparar as asas de Sage e, se ele continuar tentando voar, nós as cortamos fora – estreitou os orbes azuis.

x-X-x

- É aquele, certo? – Deidara apontou um homem de cabelos cinza e olhos negros passando apressado pelas pessoas enquanto falava com alguém pelo persocon no alto de sua cabeça.

- Sim. Touji Mizuki, fugitivo da Folha e ex-aliado de Orochimaru. Não passa de um chuunin, a captura vai ser fácil – o Akasuna dizia enquanto caminhavam atrás dele. – Liza, Aoi, deixaremos isso com vocês.

Os dois menearam a cabeça afirmativamente e apressaram o passo, deixando os senseis para trás apenas os observando. Ao alcançarem o homem, Liza segurou seu ombro e virou-o.

- Hey, que idéia é essa? – ele apertava um botão no persocon para encerrar a chamada. – O que vocês querem?

- Você é Mizuki? – Aoi perguntou.

- O quê? – recuara ao ouvi-lo usar aquele nome. – Devem estar me confundido com alguém... Acontece sempre – sorriu e tentou sair dali, mas a Inuzuka segurou-o pelo ombro novamente.

- Você virá conosco, Mizuki-kun.

- Olha, não tenho mais nada a ver com vocês, está bem? Estou quieto no meu canto, vivendo a minha vida pacificamente. Certo que eles não quiseram me dar permissão para estar vivendo entre humanos, mas não precisa me arrastar para uma daquelas prisões. Espere... Vocês não são Exterminadores, são? Eu volto para o território shinobi, ok? Não quero confusão.

- Somos da Akatsuki, e você deve vir conosco.

- Ah, merda...

Mizuki virou-se novamente para fugir, mas Aoi prendeu linhas de chakra em seu corpo e o fez estancar. Puxou o homem enquanto ele se debatia e xingava, chamando a atenção das pessoas em volta.

- Eu não tenho mais nada a ver com o Orochimaru também! Não sei onde ele está ou o que está procurando. Agora me solte!

Aoi acenou para Liza e saiu arrastando o chuunin pelas ruas, sem dar atenção as suas ameaças e reluta. Sasori e Deidara os seguiram para pegar um avião e voltar à base central. Para primeira missão aquilo fora incrivelmente simples, mas valeria a pena a viagem se ele realmente pudesse ajudá-los.

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Após caminhar por vários minutos pelos corredores da base pararam defronte a uma porta. O rapaz moreno que caminhava à frente lançou um breve olhar aos seus acompanhantes encapuzados e então a abriu. Deixou que eles entrassem primeiro no laboratório, e ao passar tomou o cuidado de desligar as câmeras de segurança para só então acenar para eles retirarem os capuzes. Orochimaru e Kabuto o fizeram e lançaram as peças sobre uma mesa ao lado.

- Orochimaru – Nagato chamou-o, atraindo a atenção dos olhos dourados que antes vagavam pelo cômodo. – Não esqueci disso. Você voltou a ter o direito de usá-lo – enquanto falava tirava do bolso um anel, passado-o ao homem à sua frente.

Ele sorriu e pegou a jóia, pondo-a no dedo mínimo esquerdo para em seguida voltar-se ao laboratório. Achou o que procurava no fim da sala e o sorriso em sua face branca alargou-se. Desacordada e presa a uma mesa estava Karin, com o corpo tapado por alguns panos.

- Fiquem à vontade, vocês têm nossos laboratórios a sua disposição. Um de nossos persocons trará comida, há camas e um banheiro ali – indicou a sua direita com um aceno de cabeça. – Virei diariamente ver como estão progredindo.

Nagato virou as costas e saiu da sala, deixando os dois a sós. Passados alguns segundos que o rapaz retirou-se, Kabuto foi até a porta e tentou abri-la, mas estava trancada.

- Ele nos prendeu aqui.

- Já era de se esperar. – Fez descaso disso e apanhou uma prancheta ao lado de onde a kunoichi estava deitada. – Deve estar planejando algo contra mim, sinto a presença de Mizuki no prédio.

- Não vamos fazer nada?

- O que sugere? Derrubar a porta? Não, eles têm tudo o que precisamos aqui. Vamos trabalhar como se não tivéssemos percebido nada de errado e esperar o momento oportuno. Agora me passe um sedativo, Kabuto, não quero que ela acorde.

O Yakushi murmurou uma confirmação, vestiu um dos jalecos que estavam em um cabide e dirigiu-se ao mestre.

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- Sinto muito por todo esse transtorno – Shino disse a ela quando alcançaram o exterior da base. – Como pode ver, estamos agindo para prender os homens que a atacaram. Essas coisas não acontecem com freqüência.

- Está tudo bem, e obrigada pelos cuidados médicos. Quando os localizarem, por favor, não deixe de me avisar.

- Sim.

O rapaz tomou a mão de Riza e inclinou-se para beijá-la, o que não pôde deixar de lhe lembrar o homem de sobretudo negro que fizera o mesmo após tê-la atacado, pouco antes de ser atingida por Roy.

- Foi um prazer conhecê-la, senhorita Hawkeye, espero poder revê-la em circunstâncias menos... inconvenientes.

Riza franziu o cenho ao perceber um leve curvar de lábios sob a gola alta que ele usava. Era impressão sua ou aquele menino com idade para ser seu filho estava lhe passando uma cantada? Deu de ombros e saiu pela porta que ele abrira, lhe dizendo um último "até breve". Shino permaneceu voltado à porta fechada por um tempo, envolto em certos pensamentos sobre aquela bela mulher de olhos ferozes, e ao se virar se deparou com outro par de olhos irritados. Recuperou-se do susto que a pequena lhe dera e ficou observando-a em sua pose de braços cruzados até ela começar a falar:

- Preciso falar com você, esquisito.

- Já está falando, Hanabi-san.

- Tsc – ela resmungou, assoprando a mecha de cabelo entre seus olhos. – Lela me viu mexendo em arquivos sobre seu passado e me ameaçou. Ela disse que estão com Neji-nii-san e irão matá-lo caso eu diga alguma coisa sobre ela ser uma Akatsuki. Parece que você estava certo.

Shino arrumou os óculos no rosto e em seguida tornou a pôr as mãos nos bolsos da jaqueta.

- O que quer que eu faça a respeito?

- Fale com Tsunade-sama, traga Neji-nii-san de volta... Eu não sei, qualquer coisa.

- Está certo. Kurenai-sensei já havia me alertado a fazê-lo. Volte para casa, deixe o resto comigo.

Hanabi sorria enquanto aquela figura encapuzada entrava na base em sua postura ereta e mão nos bolsos.

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Acabara de chegar à Folha e já haviam lhe chamado na sala da Hokage. Pelo visto, estavam apenas o esperando para que lhe encarregassem daquela missão, seja ela qual fosse. Não se deixaria abalar por aqueles assuntos problemáticos, estava feliz como nunca – não havia tido chance de contar a seus amigos, mas o faria quando voltasse.

O Nara entrou na sala após ter batido e surpreendeu-se ao vê-la tão cheia. Estavam ali Asuma, Ino, Chouji, Gai, Lee, Tenten, Sakura, Sai e Hiashi, além da Hokage sentada atrás da mesa.

- O que aconteceu? – foi a primeira coisa que pensou em perguntar.

- Falarei a todos quando Kakashi chegar – respondeu-lhe Tsunade. Ela tinha os cotovelos sobre a mesa e cruzava os dedos à frente do rosto, com os olhos castanhos e cenho franzido revelando a sua irritação.

Shikamaru fechou a porta ao entrar e juntou-se ao seu time, cumprimentando-os em voz baixa – tinha a impressão de que deveria fazê-lo, pois tantos deles juntos só poderia resultar em uma notícia desastrosa. Após algum tempo a porta tornou a abrir, mas não era Kakashi e sim Shizune, acompanhada de Izumo e Kotetsu.

- Tsunade-sama, eles insistiram que deveriam estar presentes – ela explicou.

A loira afirmou com um aceno e um resmungo baixo e deixou que eles ficassem ali no canto, enquanto Shizune ia para trás da cadeira da Hokage.

- Isso está demorando demais, Tsunade-sama – fora à vez de Hiashi cortar o silêncio, aparentemente irritado. – Tenho deveres a cumprir, diga logo o motivo de ter me chamado a sua sala.

- Espere só mais alguns minutos, Hiashi-san.

O líder Hyuuga encarou-a e depois cruzou os braços, jogando-se ao encosto da cadeira macia em frente à mesa da Hokage. Após isso ainda se passaram alguns minutos de silêncio até alguém bater a porta e esta abrir-se em seguida para Kakashi entrar por ela, causando suspiros aliviados e resmungos por causa de seu atraso. Ele ainda tentou explicar-se, mas foi cortado pela voz firme da Senju:

- Quietos – ela disse em tom alto e grave, silenciando a todos. – Recentemente recebi notícias alarmantes sobre a Akatsuki. Alguns de vocês já sabem que Neji, Izumo e Kotetsu foram enviados em uma missão: eles deveriam seguir uma pista de Sasuke, voltar com relatórios e se possível trazê-lo para a base. Naruto acabou descobrindo e juntou-se a eles sem minha permissão. Os quatro foram atacados pela Akatsuki enquanto estavam passando pela fronteira. Eles levaram Neji e Naruto.

O silêncio já pesado ficou ainda mais desesperador com aquela notícia – se eles pegaram Naruto, provavelmente já tinham todos os bijuus –, mas de longe os mais afetados haviam sido o Time Gai, Sakura, Kakashi e Hiashi, cujo alguns se projetaram para frente ou já tinham os olhos marejados por lágrimas (havia sido quase como dizer que eles estavam mortos).

- Hiashi-san, preciso de sua autorização para ordenar o resgate de Neji.

O homem parecia atordoado, apenas confirmou meneando a cabeça e jogou-se mais uma vez ao encosto do assento.

- A missão de vocês é trazer de volta Naruto e Neji. Eles devem estar presos na base central da Akatsuki nesse momento. Não se importem em tomar decisões drásticas que levem a um confronto direto, nem em pedir reforços. Temo não ser exagero dizer que este será o estopim da guerra contra a Akatsuki.

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A noite já caíra há horas e estavam viajando desde cedo. O vento gélido invadia seus sobretudos e fazia arrepiar os pêlos e estremecer seus corpos. Estavam em ambiente humano, mesmo que não houvesse muitos deles ali, e caminhavam em silêncio pela pequena floresta artificial com sons de corujas e outros animais noturnos em busca dos companheiros de organização – eles estavam adiantados na viagem, mas já deviam tê-los encontrado.

O moreno que ia à frente da dupla parou de repente e estendeu o braço contra sua barriga, instigando-o a parar também.

- Algum problema, Itachi-san?

- Não está ouvindo isso?

Calou-se e procurou detectar algum som peculiar sob os ruídos naturais do lugar. Havia um baixo arfar vindo à esquerda deles, provavelmente era perto. Kisame seguiu na direção do ruído, já imaginando o que poderia ser, e ao vê-lo voltar a caminhar o Uchiha fez o mesmo, logo o ultrapassando e voltando a liderar a viagem. À medida que se aproximavam podiam ouvir com mais nitidez, mesmo que o som ainda fosse baixo, e sentir a presença shinobi. Não foi preciso andar muito para chegar a uma pequena clareira, onde na orla estava uma grande barraca cujo interior era iluminado e projetava uma sombra de formato peculiar, a seguir identificada como sendo na verdade duas.

- São eles – informou Kisame em um sussurro, mesmo que aquilo fosse óbvio. – Vamos acampar aqui ao lado?

- Sim – respondeu enquanto jogava sua mochila no chão. – Está frio, veja se consegue algo para uma fogueira.

- Acho que não são permitidas fogueiras aqui... Eles têm aquecedores.

Apontava quatro pequenas caixinhas em volta da barraca de Kakuzu e Hidan. Ao perceber que o companheiro não respondia, olhou para ele e surpreendeu-se com a raiva em sua face quase sempre impassível. Itachi começou a andar em passos pesados em direção à barraca e, antes que conseguisse segurá-lo, abriu-a em um puxão. Pôde ver por sobre os ombros dele a Kakuzu sair de cima do parceiro enquanto resmungava alguma coisa incompreensível e subia a calça, para então empurrar a Itachi e sair da barraca.

- Que idéia é essa, Uchiha? – empurrou-o mais uma vez com o indicador em seu peito.

- O que é aquilo? – apontou um dos quatro aparelhos em volta da barraca.

- São aquecedores, criança. Eles mantêm o que está dentro aquecido. Não acredito que você nos interrompeu por causa desses malditos aquecedores.

- Eu sei que o que são aquecedores, Kakuzu-san, mas o que não sei é por quê Kisame e eu congelamos nas missões enquanto você e seu parceiro têm essas coisas.

- Itachi-san, não vamos arrumar briga por causa de algo tão banal. – Tentou puxá-lo pelo braço, mas foi repelido. Já esperava que a raiva que Itachi reprimia nos últimos dias fosse estourar em algum momento, mas tinha que ser justo naquele?

- Não é banal, Kisame, esse homem está roubando dinheiro da organização. Nós sabemos que a Akatsuki não fornece esses...

- "Roubando"? – Kakuzu repetiu incrédulo. – Você está louco, Uchiha? Eu comprei com o meu dinheiro, nem tudo o que faço é para a Akatsuki e pela Akatsuki. Há muitos meios de se ganhar dinheiro, você devia experimentar.

- Que gritaria dos infernos é essa? – a porta da barraca abriu novamente e Hidan saiu, já vestido. – Porra, vão procurar o que fazer e nos deixem em paz por alguns minutos.

- Cale-se, Hidan, o Uchiha está tendo um ataque de histeria e não queremos contribuir com isso – e voltando-se a Kisame, disse: – Devia ensinar ao seu amigo a andar junto e calar quando for mandado.

- Não o provoque, Kakuzu-san, o Itachi-san só está um pouco alterado – puxou-o pelo braço novamente. – Desculpe por ter interrompido.

- O que vocês querem? – o moreno com o corpo costurado perguntou irritadiço.

- Temos que voltar a todas as bases de Orochimaru que vocês visitaram e recrutar os soldados que estiverem por lá. Nagato-sama também enviou uma lista de shinobis que devemos procurar. Parece que Orochimaru está vivo e ele o está mantendo dentro da base para alguma coisa, mas quando concluir seja lá o que estiver fazendo vamos matá-lo e assumir oficialmente o controle de seus homens – o Hoshigaki explicava enquanto puxava com firmeza o braço do mais novo para evitar que ele se desvencilhasse novamente.

- Falaremos sobre isso amanhã, já está tarde. Acampem em algum lugar perto e tenham uma boa noite – empurrou o albino para dentro da barraca, ignorando seus resmungos, e já preparava-se para entrar quando foi detido palavras de Itachi:

- Está frio, nos dê alguns aquecedores.

Kakuzu voltou-se e olhou para ele com uma fúria que Kisame conhecia muito bem dos tempos em que tinha missões com ele, antes de Itachi entrar para a Akatsuki. Esperou que a qualquer momento ele tentasse matá-lo, mas apenas disse:

- Há outras formas de se aquecer, seu parceiro sabe muito bem disso e duvido que você também já não saiba – sorriu insinuante. – Acho que é isso que está lhe faltando para acabar com essa birra infantil.

- O que quer dizer com isso?

- Kakuzu-san, por favor, dê um desses – Kisame apressou-se a dizer.

- Tudo bem, pegue.

O Akatsuki entrou na barraca e deixou os dois lá fora. Kisame abaixou-se para apanhar um dos aquecedores enquanto era mirado pelos olhos negros de Itachi, que carregava uma expressão curiosa. Seguiu o parceiro até um lugar mais afastado, onde ele punha o aquecedor próximo de seu saco de dormir, e continuou olhando-o até que o Hoshigaki se voltar a ele e retribuir ao olhar.

- O que ele quis dizer com aquilo, Kisame?

- Aquilo o quê? – lhe virou as costas e começou a arrumar seu próprio saco de dormir.

- "Seu parceiro sabe muito bem disso".

- Não é importante...

- O que não é importante? – dava a volta para encará-lo.

- Faz muito tempo... Era no começo da organização ainda, nós tivemos algumas missões juntos... Bem, acabou acontecendo.

Fez-se um constrangedor silêncio por alguns instantes.

- Você dormiu com ele?

- Sim. – Virou-se para olhar o Uchiha, que tinha os olhos caídos e retomara sua expressão impassível. O momento de descontrole já havia passado.

- Entendo. Gosta dele?

- O quê? – exclamou, para em seguida gargalhar sonoramente. – Do Kakuzu? É claro que não, Itachi-san! Foi uma noite bacana, mas só uma noite. – Sentou em seu saco de dormir e ficou olhando ao parceiro em silêncio, com um sorriso irônico ainda pairando nos lábios. – Está tudo bem com você? Desde aquele dia anda mais calado do que nunca... Sabia que é a primeira vez que está olhando pra mim depois que me mandou sair do seu quarto?

Itachi mirou o chão em seu desconcerto e apressou-se a ir em direção ao seu saco de dormir aquecido enquanto falava:

- Desculpe, Kisame. – Estancou enquanto se abaixava ao ter o pulso seguro por ele. Olhou para o parceiro, que ainda tinha aquele sorriso irônico no rosto. – Eu... Acho que... Sinto muito por aquilo, não sei o que deu em mim.

- É mesmo? – puxou o pulso que segurava, derrubando o moreno em seu colo e impedindo que ele se levantasse em sobressalto. Logo Itachi parou de tentar erguer-se e encarou-o alarmado. – Você está ficando vermelho, sabia? Ficou mais vermelho agora – riu baixinho.

Itachi tentou novamente levantar, mas sem sucesso. Acabou por desistir e deixou que o parceiro o aninhasse em seu colo, acariciando seus cabelos. Apenas pararia quando o rapaz já tivesse adormecido, então o coloria em seu saco de dormir e voltaria ao seu, feliz por tê-lo feito falar daquela noite e deixado que o tocasse novamente.

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Os detetives esperavam apreensivos aos dois mascarados; temiam que houvessem sido capturados naquele intervalo de tempo. O relógio marcava cinco minutos para a meia-noite quando puderam ouvir, aliviados, a janela ser aberta e um deles pular para dentro, depois se voltando para ajudar o outro a subir.

Caminharam até o sofá menor em frente a onde os dois jovens prodígios os olhavam e sentaram-se ali.

- Nós estávamos sendo vigiados – Questão disse após algum tempo. – Não sei se eram shinobis, mas seu sistema de camuflagem enganou a barreira do meu apartamento.

- Primeiro interrogamos entregador, depois atacados por shinobis, Vic Sage sabendo demais e sendo tirado do ar, pessoa invisível nos vigiando... Alguém nessa cidade sabe o motivo – o segundo mascarado tinha a mão no peito enquanto falava, ainda sentido as dores da noite anterior.

- Existe a possibilidade de estarem sendo vigiados por algum homem de Shiro. Ele os viu em sua casa e vocês atacaram alguém que trabalhou para ele. As chances dos shinobis os estarem vigiando são próximas a dez por cento; muito baixas – dizia L.

- É mais sensato dizer que Shiro está de olho para saber o que vocês estão fazendo com as informações, pois os shinobis teriam atacado imediatamente, como fizeram antes – Haruma concluiu sem tirar os olhos do cubo em suas mãos.

A janela foi aberta mais uma vez e um homem alto de pele escura e cabelos brancos entrou, trazendo no rosto uma expressão fechada. Os quatro levantaram-se de imediato, mirando o visitante. Ele estava desarmado e vestia-se de vermelho, seus olhos vagaram por todos os presentes com demasiada calma.

- Meu nome é Archer – ele disse tranqüilamente. – Estou aqui para levar Rorschach, e tenho ordens para exterminá-lo caso relute.

Nenhum deles se mostrou disposto a entregar o homem em questão, o que desenhou um sorriso satisfeito nos lábios de Archer.

- Entendo, será do modo mais difícil.

Ele estendeu as mãos ao lado do corpo e surgiram linhas que se entrelaçavam como circuitos ativos, formando duas espadas. Quando as formas estavam completas, elas ganharam cor: uma negra e outra branca. Avançou em direção ao seu alvo, mas o outro mascarado entrou na frente, tirando algo do sobretudo e atirando nele. Archer esquivou-se a tempo de ver o objeto atingir a parede e soltar faíscas pela alta tensão que expelia.

Teve o braço seguro pelo rapaz de cabelos negros, que com a outra mão em seu ombro forçou a articulação visando quebrar aquele braço, sem sucesso – as articulações de um Exterminador não cederiam tão facilmente. Livrou-se dele com um chute em seu estômago e voltou-se novamente àquele que fora buscar ali. Ao ir em sua direção mais uma vez, viu-o apanhar algum tipo de arma e atirar; um arpéu afiado passou a poucos centímetros de seu rosto e fincou-se na parede. Ergueu a espada negra e cortou o fio.

O Exterminador foi novamente pego e teve os braços imobilizados às costas, e enquanto tentava desvencilhar-se dos braços magros da garota, que formavam uma prisão realmente eficaz, o segundo mascarado veio a sua frente e socou o seu rosto repetitivas vezes. Assim que sentiu o sangue escorrer por sua face decidiu que acabara a brincadeira, não ia mais prolongar aquilo. Archer ergueu os dois pés, deixando-a segurar todo o seu peso, e chutou o peito aberto de Questão com toda a sua força, fazendo cair tossindo violentamente. Em seguida formou novamente as espadas nas mãos e cortou superficialmente os braços que o seguravam – poderia tê-la matado agora, mas não tinha permissão para isso. Haruma também recuou, deixando-o livre mais uma vez.

Rorschach estava só próximo à janela, olhando os companheiros com a mão no peito que latejava dolorosamente. Ao ver o homem vindo em sua direção, tirou uma garrafa do bolso e ergueu a máscara para encher a boca ao máximo. Limpou os resíduos com a manga, tirou um isqueiro do bolso e levou-o aceso para perto da boca. As chamas que se alastraram ao cuspir a colônia pegaram Archer de surpresa. Vários móveis e papéis ficaram chamuscados pelo fogo e o pano vermelho em volta da cintura do Exterminador ficou em chamas.

Soltou o pano sobre a calça preta para impedir que ela também pegasse fogo e voltou-se já furioso àquele que vestia sobretudo castanho. Preparava-se para avançar sobre ele mais uma vez, de olho no vidro de colônia e no isqueiro que ele tinha em mãos, quando sentiu-se ser agarrado novamente pelos ombros.

"Chega!" – Archer fugiu em pensamento.

Em um gesto impensado e furioso, juntou as duas espadas e abaixou-se para se virar bruscamente e atingir o peito daquele rapaz de cabelos negros e pele pálida. A camisa branca que ele vestia foi tingida de vermelho, o sangue quente escorreu pelo o chão e jorrou na face de Archer, cujos olhos estavam arregalados e a boca entreaberta ao puxar as espadas ensangüentadas e ver o rapaz desabar no chão em uma poça de seu próprio sangue.

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