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Parte Um - The Game
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Música Tema - I Get Off (Halestorm - PS-Para experiências mais intensas, escutar enquanto faz a leitura ;) )
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A madrugada brigava nas janelas, inundando o interior com seu brilho platinado, brincando de acinzentar os carpetes que tocava, a rua já começava seu rito inicial de silêncio, pontuado por poucos ônibus que passavam.
No condomínio construído originalmente luxuoso, a noite já chegara às dez, quando se tinha início a imposição do rigor do silêncio, prezado pela maior parte dos moradores do lugar. Camus costumava chegar em casa naquele horário, logo depois das duas, apenas para estar trabalhando novamente às oito. Tinha somente tempo de tomar um banho rápido antes de deitar-se, exausto.
Muito embora aquela rotina se estendesse por vários anos, começava a ver-se cansado e deprimido. Estar sozinho e trabalhar em excesso o deixava repuxado, esticado e velho.
Na verdade, não podia muito reclamar, pois embora grande parte do trabalho que fazia envolvia burocracia e muita papelada, ganhava um bom dinheiro por isso. Não estava vivendo o sonho americano?
Fazia anos que não via nenhum amigo seu, sequer um conhecido, apenas colegas de trabalho, com quem nem ao menos conseguia sair depois do expediente, pois, os poucos que trabalhavam o mesmo turno que si, queriam apenas chegar em casa e se jogar na cama.
Esse isolamento a que estava imposto era desgastante e embora não fosse exatamente uma pessoa social, todo aquele silêncio começava a tomba-lo.
Chega em casa em apenas mais um fim de dia de trabalho, sentindo os joelhos doerem. Apesar de naturalmente magro, bastante magro, ultimamente tudo o que vinha fazendo era ficar o dia inteiro sentado. Lutando contra o sedentarismo passara a voltar todos os dias a pé para casa, mas a ideia agora lhe parecia idiota, com as juntas doendo, os joelhos pedindo clemência por existirem.
Sua mente estava quase desligada, no automático. Acende a luz da cozinha, ouvindo o apito constante emitido pela geladeira. Alcança o copo de água gelada, apoiando a cabeça no aparelho eletrônico a sua frente. Estava esgotado. Relanceia o micro-ondas pensando quanto tempo fazia desde a última vez que pudera jantar. O pensamento não lhe dá ânimo.
Solta o rabo de cavalo baixo, permitindo que os longos cabelos lisos, vermelhos espalhem-se pelas costas da roupa social. Tira a gravata, voltando para a sala, lembrando-se de apagar as luzes. Ainda robótico larga o terno e a gravata em cima do sofá. Solta os primeiros botões da camisa, tirando-a de dentro da calça, sentindo-se incrivelmente mais livre.
Também tira os sapatos e meias, deixando-os todos jogados ali, em sua sala impecavelmente organizada, moderna e meio vazia, de cores metalizadas. Sentia-se rebelde e tolo em medidas iguais por isso.
Caminha em silêncio, parando apenas um instante na frente de seu escritório/biblioteca. Todo seu corpo clamava por um banho, por descanso. Antes de sair precisava ter respondido alguns documentos, mas não tivera tempo. Seu chefe estava no aguardo. Pondera alguns segundos, balançando o corpo para frente e para trás, a mão apoiada no batente da porta.
Desde quando precisava de alguma desculpa para trabalhar? Suspirando alto e com certo inconformismo cruza a porta.
Quem sabe isso não o faria sair um pouco mais cedo do trabalho pela manhã? O pensamento sem graça o faz rir de si mesmo, escarninho, sério. Há quantos anos não ria de verdade? Sem mágoa, afasta o pensamento ligando o laptop em cima da mesa.
Decide não ligar a luz, decidindo que se não o fizesse faria o que tinha para fazer mais rápido e poderia ir dormir mais rápido. Quem tentava enganar? A luz azul refletia-se pelo cômodo, pelo seu rosto, parando bem em cima de seus óculos, incômoda. Espreguiçando-se na cadeira, tira os óculos, jogando-os na mesa, coçando os olhos com as costas das mãos, bocejando.
Enquanto o maldito iniciava, levanta-se indo em direção a sua esquerda, onde a grande janela de vidro, que ia de seus joelhos e quase até o teto ficava. Abre as cortinas, permitindo a vítrea luz da lua entrada, vendo os livros a seu redor, as caixas que nunca desempacotara, nem tivera vontade. Volta a encostar a cabeça no vidro, abraçando-se de leve, suprimindo um arrepio fatigado.
Volta a abrir os olhos quando ouve o leve toque que indicava que seu laptop iniciara. Voltando a dar uma espreguiçada forçada, seus olhos repousam na janela da frente, rapidamente, antes de se voltar para trás.
A janela também tinha as cortinas abertas, o cômodo de televisão estava vazio e escuro, as luzes apagada. Pelo horário avançado, não podia dizer que estava surpreso. Aliás, aquilo lhe traz de volta a história do vizinho da frente. Todos os apartamentos haviam sido projetados de forma que suas janelas não se encarassem, pois, como os apartamentos eram muito próximos, apenas alguns poucos metros de distância, acharam que aquela seria a maneira mais confortável de criar uma barreira de intimidade entre os moradores.
Ainda assim, misteriosamente, alguns meses antes, o morador da frente reformara seu apartamento colocando justamente uma janela de frente para a sua. Estavam tão próximos que, se o vidro abrisse bastaria que os dois esticassem as mãos para se tocarem.
Apesar do fato ser peculiarmente estranho Camus o irrelevara completamente. Não era como se estivesse em casa de qualquer forma. Onde poderiam haver reclamações?
Senta-se, voltando a colocar os óculos e abrindo os arquivos. Assim, segundos tornam-se minutos, que se esticam e dobram-se em uma passagem de tempo digna de prêmios. Camus só a nota quando mexe-se de leve na cadeira estofada e suas costas ardem pela posição inclinada.
Resmungando endireita-se, sentindo os olhos arderem. Há quanto tempo estava ali? E nem ao menos tomara banho, sendo que em menos de seis horas estaria em pé e trabalhando. Disso geme incontido, sentindo-se inútil e mesquinho. Deveria ter dormido quando tivera a chance.
É quando um movimento lateral é captado por sua visão periférica. A luz acendera-se no quarto vizinho. Despreocupadamente Camus o esguelha. Um rapaz alto e moreno espreguiçava-se de maneira felina. O ruivo pensa sobre o que ele faria de pé naquele horário.
Os cabelos longos eram loiros e cacheados, repicados, a blusa era rasgada, assim como as jeans, dando-lhe uma aparência propositalmente rebelde. Tinha de admitir que o rapaz era bonito. Nunca o vira, aquela era a primeira vez. E eram vizinhos há quanto tempo agora? Pelo menos uns dois anos pelos seus cálculos. Pelo menos isso mesmo. O fato o surpreende. Ainda assim, nada poderia prepara-lo para o que viria a seguir, quando o rapaz alto dirige-se para o sofá ao fundo da sala, no canto mais longe da visão de Camus, mas ainda diretamente a sua frente, sentando-se.
O pensamento de que o sofá não estava virado para a televisão, que ficava a esquerda da entrada não lhe passa despercebido.
Ainda assim, todo o resto é esquecido quando o rapaz simplesmente abre o jeans, tocando-se de leve, fechando os olhos. Camus sente seu sangue gelar, para depois começar a palpitar nas veias. Não devia estar vendo aquilo.
Seu primeiro impulso é levantar, pular da cadeira, mas mantém-se onde estava, congelado. Não queria ser notado.
O moreno agora abrira todo o zíper e se tocava com mais vontade, jogando a cabeça levemente para trás, deixando o membro exposto, massageando-o devagar com os dedos compridos. A mão livre apertava o braço do sofá com firmeza. Camus quase podia imagina-lo contendo os gemidos baixos.
A mão subia e descia devagar, precisa, fazendo o rapaz se remexer suavemente, a respiração alterada, o peito subindo e descendo, a cabeça ainda tombada. Era lindo e incrivelmente erótico.
Engole em seco. O que ainda estava fazendo ali? Seu coração batia com tanta força que quando empurra sua cadeira de rodinhas para trás calcula mal a força a utilizar e acaba batendo-a contra a parede a seu lado. Agora estava mais perto da porta do que nunca, tudo o que precisaria fazer era se levantar e sair.
Mas, aparentemente aquele fora o movimento errado, pois, ao levantar o rosto pálido, depara-se com o rosto moreno olhando diretamente para si, através das trevas.
Estavam no oitavo andar, os únicos apartamentos de frente um para o outro. Seria possível que era o único a testemunhar aquilo?
Estaria ele enxergando-o? Tinha certeza de estar totalmente envolto na escuridão, mas ainda assim não tinha certeza se ela era forte o suficiente para esconder sua figura contra a luz do quarto oposto. Seu coração berrava em sua caixa torácica, bombardeando sangue para onde não devia.
É quando nota que a luz fraca proveniente de seu laptop ainda se refletia pelo cômodo, diáfana. Não era o suficiente nem para que ele enxergasse corretamente o que o cercava, mas tinha certeza de que aquilo ajudava o rapaz a sua frente, e também tem certeza de que ele o viria, caso resolvesse levantar e correr, mesmo que fosse só a forma de sua sombra. O que seria menos embaraçoso?
É quando as coisas ficam mais estranhas.
Ainda olhando diretamente para onde Camus estava, o rapaz lambe os dedos de leve, levando-os de volta ao sexo rígido. Os olhos penetrantes pareciam olhar diretamente para si, forçando para manter-se abertos, fechando-se de leve ocasionalmente, os dentes mordendo o lábio inferior com força, o movimento sensual, libertino.
Camus sente o efeito imediatamente, seu rosto cora, mas certa parte de seu corpo é desperta, intensamente. Sua respiração torna-se mais pesada. O rapaz aumenta o ritmo, os olhos quase cerrados pelo prazer.
Hesitante, Camus toca de leve seu próprio sexo, sentindo-o rígido, túrgido contra sua mão. Não consegue evitar um suspiro forte com o simples toque. Há quanto tempo não se masturbava? Há quanto tempo não tinha o mínimo de satisfação sexual para aliviar-se?
Não tinha tempo para isso.
Com isso, se toca com mais determinação e força, gemendo com o contato. Abre a calça social e liberta o sexo, ainda descrente com o que estava a fazer. Sem pensar muito a respeito, proibindo-se, fricciona-se com força, sentindo uma corrente elétrica imensa percorrer seu corpo.
Seus olhos se trancam nos olhos a sua frente. O que diabos estava fazendo? Geme alto e volta a percorrer seu sexo com força. Sua cabeça tomba e ele geme alto mais uma vez, segurando com força sua calça com a mão que tinha livre. Queria gritar, mas contém-se. Nunca fizera algo tão devasso.
Os olhos a sua frente eram pesados, libidinosos e pareciam devora-lo. Como alguém poderia ter o olhar tão intenso?
E assim, sem aviso, ao avistar o rapaz alcançar o orgasmo, soltando-se, a respiração super acelerada, o peito subindo e descendo, a cabeça apoiada no encosto, quebrando o contato visual, também alcança seu ápice, batendo a cabeça na parede atrás de si no processo. Respira fundo algumas vezes, tentando ganhar o controle de si mesmo. Ele tremia de corpo inteiro.
Os pensamentos pareciam difusos, confundindo-se em sua mente. O que diabos tinha ido fazer? Quem era aquele cara em primeiro lugar? Ainda exaltado põe-se de pé e para fora do escritório em um único movimento.
Não tem coragem de voltar para desligar o computador, muito menos de olhar para ver se o rapaz ainda estava lá. Não queria saber. Toma um banho rápido, cheio de arrependimentos, mas, naquela noite, quando deita-se em sua cama, não consegue evitar sentir-se mais leve, descansado. Talvez finalmente tivesse encontrado algo para aliviar seu estresse, afinal de contas.
O dia seguinte segue uma rotina normal, irrelevante até, um dia prolongado e particularmente difícil. Chega em casa sentindo-se particularmente esticado, como se o colágeno de sua pele já não fosse suficientemente jovem para aguentar aquela situação.
Ainda mais do que o normal, sentindo as horas que desperdiçara trabalhando pesando em suas costas. Afasta o pensamento com desnecessária violência, confuso e embaraçado.
Depois de devidamente banhado, reprimindo um bocejo, sente certa curiosidade aflorar seu interior. Sentia-se um adolescente besta, com borboletas no estômago, ou um jovem em sua primeira entrevista de emprego. Não era ambos, então engole em seco, reprimindo as sensações. Era senhor de si mesmo. Repete o mantra incontáveis vezes, até prostrar-se diante da porta fechada. Tudo o que o separava de sua curiosidade.
Uma porta. Como aquilo poderia ser mais emblemático? Ri de escárnio, ouvindo o som ressoar pelas paredes frias e escuras do apartamento. Não ousara acender nenhuma luz. Inconscientemente mantivera um controle apertado do tempo e sabia estar adiantado em relação a noite anterior. Faria diferença? Era idiota por querer saber se ele estaria lá? Afinal o dia anterior fora uma exceção, uma história estranha e peculiar que pretendia ocultar em seu histórico de vida. Não havia nenhum motivo para se repetir, ou mesmo para a sequer presença dele, havia?
Sentindo os ouvidos zumbirem de ansiedade e xingando-se mentalmente por isso, Camus abre a porta. O quarto banhava-se em sombras líquidas, como no dia anterior, fugidio. O ruivo olha em volta, notando tudo como deixara no dia anterior, com exceção do laptop que lembrara-se de desligar pela manhã.
Sua cabeça pesava com um pouco de dor de cabeça pungente e o friozinho na barriga avisava que não devia fazer nada daquilo. Deveria ir dormir, afinal teria um longo dia pela manhã.
Seus olhos se trancam na janela vizinha, resolutos. E qual não é sua surpresa? Ele estava lá. Curioso de como aquilo iria se desenrolar, senta-se na cadeira macia de forro vinho, ainda encostada a parede, encarando-o da treva. Estava nervoso como em poucas situações de sua vida, o ocorrido anterior juntando-se a perspectiva do que poderia acontecer. Por algum tempo sua vida tornara-se ficção, espere o inesperado.
Seus dedos formigavam pela expectativa.
Não frustrando seus planos, as coisas aconteceram quase como no dia anterior, com ele olhando diretamente para si, parecendo vê-lo contra todas as probabilidades. O oculto, desconhecido e até um pouco sujo, tão diferente que tudo com que estava acostumado excitava Camus, desgastado do correto.
E saber que ele o assistia se dando prazer, fazendo o mesmo só servia para excita-lo ainda mais. Depois de mais do que fizera antes, observando a inclinação do pescoço dos cachos loiros, alcança o clímax e, exatamente como no dia anterior, assim que consegue recuperar a respiração, corre para a porta indagando-se o que diabos estava fazendo.
Mas, dessa vez, pouco antes de sair do quarto, esguelha brevemente para trás e o vê, encarando-o de volta, intensamente, respirando fundo, os olhos veementes, a posição inalterada, as pernas levemente abertas, a mão ainda no zíper, a abertura do jeans.
Camus fugiu da cena o mais rápido que pôde, confusão derramando-se sobre seu sossego.
Por mais difícil de acreditar que fosse, a situação continuou se repetindo. E agora, de uma forma bizarra, Camus tinha certeza de que o rapaz sabia que ele estava ali, sempre tinha sabido, mesmo que ele não soubesse como e principalmente por quê.
Outra verdade é que seus joelhos pararam de doer, coisa que aceitou com algum riso, achando que a coisa seria cômica, não fosse tão esquisita. Parecia uma espécie de roteiro mal escrito ou algo do gênero. A verdade é que se não tivesse lhe fazendo tão bem, lhe dando tanta disposição, teria parado. Mas devia confessar, que lá no fundo, aquele jogo, porque só assim poderia ser chamado, não é mesmo? Lhe dava um prazer interno, a brincadeira com o desconhecido, perigoso. Aquilo era metade da excitação.
Perguntava-se se o rapaz do outro lado já fizera alguma coisa do gênero antes e por quê o fazia agora, se seus motivos seriam minimante parecidos com os seus.
No final de uma semana aquilo começou a ganhar um certo ar de familiaridade, que Camus também achou cômica, afinal de contas.
Sempre por volta do mesmo horário o encontrava ali, esperando por ele. Os dois faziam a mesma coisa, com Camus mantendo suas luzes apagadas, mais recatado, o máximo que poderia ser em uma situação como aquela, e depois fugia o mais rápido possível.
Até aquele tempo, Camus começara a considerar a situação minimamente mais normal, pelo menos, na verdade, começara a acostumar-se com ela.
O trabalho continuava igual, puxado, exigente. Não soube dizer exatamente quando, mas começou a ter tosse, uma tosse seca, que durou dias. Depois disso vieram as dores de cabeça, fortes e intensas, que duravam o dia inteiro, obrigando-o a aumentar seu intervalo do café, para tomar uma aspirina, torcendo para que ela logo fizesse efeito.
No meio disso tudo, suas noites prolongadas estendiam-se. Mas, como pareciam lhe fazer bem, continuou, teimoso. No final da mencionada semana, não se impressionou ao perceber que tinha febre.
Era final de expediente e sua cabeça rodava, seu corpo doía por toda a parte, cheirando a doença. Precisaria de uma boa noite de sono. Com alguma conversa, seu chefe o liberou por volta das dez horas, e ele aproveitou para pegar um táxi para casa. Naquele dia, nada de longas caminhadas.
Chegou no apartamento arrastando os pés, exaustão berrando de cada um de seus poros. Com o cabelo preso em um rabo de cavalo baixo, tomou um longo banho morno, temeroso demais para ir para o frio. Depois, arrastou-se para a cama, sem nem pensar a respeito, apagando assim que sua cabeça encostou no travesseiro.
Publicada: 11.01.2015
Hello folks! Como estão? Passaram bem as festas de final de ano? :)
Só queria dizer que originalmente este projeto era uma oneshot! Sim uma ONESHOT, porém, com mais de quarenta páginas dela escrita, já originalmente dividida em partes, pedaços de trama, resolvi dividir mesmo e publicar por partes as well, espero que não se importem e apreciem :)
Como ela está praticamente pronta, dependendo do número de reviews posto mais rápido ^^~
Obrigada pela consideração, espero que gostem da históra!
Até a próxima!
Ja ne!
Suss.
