Estava um dia lindo fora do salão comunal da grifinória, mas a monitora Lily Evans encontrava-se do lado de dentro aproveitando seu tempo livre para terminar algumas lições. Não era uma cena incomum, honestamente. Sendo monitora chefe e aluna nota A, Lily parecia se esforçar duas vezes mais para dar conta das matérias. Mas às vezes era só chato, como naquele dia.
A ruiva estava a ponto de deixar a pena de lado e aproveitar o tempo livre com os amigos quando alguém entrou no salão comunal.
— Oi, Lily — sorriu Remus Lupin. A garota sorriu também, de forma automática. Gostava de Remus, ele era sempre gentil e atencioso, embora andasse com péssimas companhias. — O que faz aqui dentro? Soube que está acontecendo um campeonato de bexigas no pátio.
— Sou horrível nesse jogo — resmungou Lily. — Mas você é ótimo, por que não está participando?
— Na verdade eu vim pegar minhas coisas, a professora McGonagall acabou de informar que minha mãe não está se sentindo muito bem — comentou Remus, com um olhar cabisbaixo.
Por um segundo, um olhar de compreensão foi trocado entre os dois, mas Lily logo tratou de esconder a expressão.
Severus tinha certeza que o segredo por trás dos desaparecimentos do garoto era que Remus era um lobisomem. Lily nunca admitiu para o amigo, mas era uma teoria que ela mesmo possuía há anos, antes mesmo de Sev ventilar a ideia. Porém nunca pensou em compartilhar isso ou investigar para ver se tinha razão. Aquele era um segredo grande demais para se sair comentando, e Remus era uma pessoa boa demais para ela deixar Sev destilar veneno sobre sua vida.
— Eu faço notas das aulas para você — sorriu a menina, recebendo de volta um sorriso agradecido. — Vai ficar tudo bem, Remus.
— Muito obrigado, Lily. Vejo você daqui há alguns dias.
Em uma semana, ela sabia.
Não muito depois de Remus deixar o salão comunal com uma mochila, o pessoal da grifinória foi chegando para se trocar para o almoço.
— Lily! — exclamou Mary ao se sentar ao lado da ruiva. — Você perdeu o campeonato de bexigas, foi bem divertido.
— Aposto que foi. Quem venceu? Potter? — implicou Lily, sem tirar os olhos do pergaminho.
— Vincent, na verdade — resmungou Mary. — Aquela garota apareceu no meio da partida e saiu com o James.
— Garota? Que garota? — perguntou a ruiva, distraída.
— Rosier, é óbvio — suspirou Mary. — Acha que eles são um casal? Ela totalmente não faz o tipo dele.
— Não tenho ideia de qual é o tipo do Potter, Mary — Lily odiava aquele tópico de conversa, embora para ser franca, ela quem tivesse começado dessa vez.
— Você é o tipo do James, Lily — murmurou Mary, rindo do revirar de olhos da amiga. — Estou te dizendo! Aposto que ele ainda é louco por você.
— Duvido muito disso — resmungou a monitora. — E também não me importo. Tenho coisas mais importantes para pensar no momento. E quer saber? Tomara que ele e a Rosier estejam juntos e felizes, porque James Potter é um problema que eu não preciso e nem quero ter. — finalizou a ruiva, enquanto recolhia seus pertences um pouco rápido demais, já era hora do almoço, e para ser sincera ela estava faminta.
A caminhada até o salão foi silenciosa, e Lily usou esse curto espaço de tempo para refletir sobre o que Mary lhe dissera sobre Potter. Ela falava sério sobre não se importar. Ele era um problema. Arrogante, imaturo, inconsequente e um pé no saco. E às vezes – sempre – a tirava do sério! Mas como disse, este era um problema que ela não queria ter, e assim o pensamento sobre o garoto sumiu tão rápido quanto surgiu em sua mente, sendo substituído pela pergunta que valia um milhão de doláres: "o que seria servido no almoço?", seja lá o que fosse, estava cheirando muito bem. E Potter jamais teria cruzado sua mente novamente se Mary não resolvesse interromper o seu almoço maravilhoso.
— James tá olhando para você — murmurou a garota.
— Ele devia estar olhando para namorada dele, que está sentada ao lado dele — resmungou Lily, enquanto cortava seu sanduíche em pedaços e se continha para não revirar os olhos, gostava da amiga, mas às vezes se cansava dela.
— Ela também está olhando pra você.
Ao ouvir isso, Lily levantou seu olhar em direção ao casal que estava sentado na outra extremidade da mesa. E de fato, eles estavam a encarando, e pareciam discutir algo.
— Você acha que ela está com ciúmes? Já imaginou se ela descobriu que o James ainda gosta de você e estiver terminando com ele? — especulou Mary animada.
— Não! Pelo amor de Deus, Mary — Lily revirou os olhos. — Apenas… ignore eles.
O casal sensação não era o único olhando para a ruiva, na verdade. Ela podia sentir o olhar de Severus do outro lado do salão. Apesar da recomendação, Lily voltou seu olhar para James e a Elizabeth. Invejava um pouco os dois, a forma como a loura simplesmente sentava em meio aos grifinórios e como os dois estavam sempre juntos pelos corredores… ela não conseguia imaginar Sev perto da mesa da grifinória nem se fosse para salvar a própria vida. Não que ela quisesse, sabia que ele se sentiria desconfortável, mas mesmo assim…
Desviou o olhar, com a expressão em branco e terminou seu almoço silenciosamente.
A primeira aula que Lily tinha logo após o almoço era Trato das Criaturas Mágicas, onde o assunto continuava a ser testrálios, e como o professor Kettleburn gostava que a turma se misturasse um pouco, Lily então acabou fazendo par com Charlotte Collins para cuidar de um testrálio fêmea.
— Você vai ter que me dizer o que fazer, porque eu não consigo ver — informou Lily, aproximando-se da loura com um balde e uma escova para darem um banho no animal.
— Não sei se eu sei o que fazer, na verdade — resmungou Collins. — É só dar um banho nela?
— Acho que sim — respondeu Lily, meio receosa. — Trouxe maçãs.
— Aqui, dá pra ela — Charlie falou alisando algo que Lily não conseguia ver. — A boca fica do lado de cá.
— Posso perguntar uma coisa? — questionou Lily, observando a maçã ser devorada por algo invisível.
— Meu irmão — respondeu, dando as costas para a ruiva. — Uma doença trouxa idiota, ele morreu pouco tempo depois que nasceu. Era isso o que você ia perguntar, não é?
— Sim, sinto muito…
— Tá tudo bem, Evans. Vamos começar logo com isso. Aquamenti! — o feitiço produziu um jato de água que a loura foi cuidadosamente direcionado para o animal. Lily conseguia ver o formato da água escorrendo em algo que se assemelhava a um cavalo. Um cavalo com asas?! — Consegue ver isso?
— Sim — sorriu a ruiva, aproximando-se com a escova.
— É lindo — murmurou Charlie, alisando as asas do animal. — É tipo um pégaso punk.
Lily riu com o comentário, lavando o que julgava ser as patas do animal.
— Isso me lembra um desenho que eu assistia quando criança, Hércules, ele tinha um pégaso branco.
— Eu assistia essa porcaria. O pégaso não tinha nome, ou o nome do pégaso era Pégaso?!
— Vai saber — deu de ombros a ruiva. — Eu gostava desse desenho. Tinha bastante coisas mágicas nele.
— Mas meu pai cortou depois que eu criei um fogo azul estranho na casa — suspirou Charlie.
Lily riu mais uma vez.
O resto da tarde foi dividido entre cuidar do testrálio, o qual apelidaram de Storm, em homenagem a Susan Storm do quarteto fantástico, uma das personagens em quadrinhos e desenho animado preferido das duas, e conversas banais sobre quais eram os seus desenhos preferidos quando eram criança. E não foi muita surpresa descobrir que as duas preferiam aqueles em que haviam mágica, e que ambas possuiam predisposição para acidentes mágicos em casa após uma sessão de desenhos. Falaram sobre os filmes que gostavam, os que detestavam e descobriram que por pouco não se encontraram no cinema durante as férias. Terminaram a tarde cantarolando Ain't no mountain is high enough.
— Sinto falta de falar dessas coisas — admitiu Lily quando estavam guardando os materiais. — Sabe, coisas trouxas.
— Ah! Por favor, Evans — resmungou Charlie. — Não vem com esse papinho pra mim, eu não sou sua nova melhor amiga.
Lily revirou os olhos para a loura, mas sorriu.
— Não se preocupe, você continua uma estranha para mim.
— Okay, bem melhor assim — concordou Charlotte. — De estranha para estranha, foi legal conversar com você.
— Digo o mesmo — sorriu Evans. — De estranha para estranha, claro.
As duas trocaram um olhar e riram.
— Charlie! — gritou alguém, no que a loura virou-se e encontrou Violet, com uma cara nada amigável.
— Oi? O que foi? — perguntou a artilheira de quadribol, surpresa e um pouco assustada.
— Já te conto o que foi! — Violet respondeu, por entre os dentes, puxando a amiga pelo braço. — Ah! Oi Lily, tchau Lily! — cumprimentou a morena como se tivesse acabado de notar a presença da garota ali.
— Até mais, estranha! — gritou Charlotte enquanto se distanciava sendo arrastada pela amiga.
Lily acenou de volta, ainda rindo. A tarde tinha sido uma experiência no mínimo diferente, para não dizer estranha, mas ela não estava reclamando.
Quando voltou para o castelo Lily resolveu tomar um bom banho antes do jantar. Depois do banho, ajudou alguns alunos no salão comunal. Aplicou uma detenção em um terceiranista que tinha sido pego soltando bombas de bosta pelo castelo, e após uma hora de polimento de troféus ele já havia contado todos os problemas que estava tendo com a garota que gostava, e como ela possivelmente estava apaixonada por seu melhor amigo. Era quase triste o fato de um terceiranista possuir uma vida amorosa mais agitada que a dela. A verdade é que Lily não tinha uma queda por ninguém desde o quarto ano, quando Fabian Prewett havia se formado e saido da escola. Altos sonhos de filhos ruivos corriam pela cabeça da garota na época.
— Não sei, Danny — murmurou a ruiva. — Talvez a Sandy goste do Mike só como amigo. Você deveria dizer a ela como se sente. E definitivamente devia parar de jogar bombas de bosta no corredor.
Quando o relógio anunciou que já eram seis horas em ponto, o garoto anunciou que havia terminado e assim os dois seguiram para o salão principal para o jantar, quando viu o corredor apinhado de gente.
— Uau! — disse o garoto. — Acha que eu devia fazer isso para Sandy?
Não. Definitivamente não, pensou a garota, porém não chegou a verbalizar. O motivo do congestionamento no corredor é que no meio dele James Potter estava cercado de balões vermelhos e confetes, com letras flutuantes acima de sua cabeça que formavam a frase: quer namorar comigo?
Antes que o potencial daquela vergonha alheia lhe atingisse, Elizabeth Rosier apareceu no corredor e Potter se ajoelhou, como se fazem nos filmes em momentos como esse, em um joelho só e repetiu a frase, como se precisasse ser mais claro.
— Quer namorar comigo, Eliza?
Foi uma gritaria geral, meninas e meninos. Danny gritava do seu lado. Mesmo que Lily quisesse sair dali, o que ela meio que queria, não havia como, estava encurralada, na fila da frente para presenciar o pedido de namoro exagerado de James Potter.
As pessoas foram perdendo a voz a medida que Elizabeth ia mudando de cor, de vermelha para roxa, e James ia murchando um pouco o sorriso.
Pobre garota, pensou olhando para Rosier. Aquilo era bem humilhante. O pior é que Potter nem parecia saber muito bem o que estava fazendo de errado.
Elizabeth puxou James pela camisa para fora do corredor com uma cara não muito amigável.
— Vamos jantar — chamou Lily, puxando Danny para o Salão Principal. — Acabou o show.
— Mas eu quero saber o que ela vai dizer! — reclamou o garoto.
Será que Rosier ia dizer não? Mas os dois já eram meio que namorados...
— Não é da nossa conta.
Quase chegando no salão ela ouviu James gritando no corredor:
— Ela disse sim! — ele parecia contente. Talvez não tão vitorioso quanto parecia minutos atrás, mas contente o suficiente. — Agora me ajudem a limpar essa bagunça…
Então era isso, James Potter estava oficialmente fora de seu caminho. Era estranho, mas como ela havia dito, não era da conta de ninguém.
Jantou com suas amigas. Tinha planos de enrolar o jantar até às sete, mas com a comoção do novo/velho casal tinha a impressão que todo mundo estava olhando para ela também, já que James não estava no jantar para ser olhado. Rosier jantava na sua própria mesa, e recebia muitos olhares atravessados por lá.
Decidiu matar o tempo na biblioteca. E ao se encaminhar para um canto mais reservado deu de cara com Violet Collins se agarrando com um aluno da corvinal atrás de uma prateleira.
— Oh! Meu Deus, me desculpa! — exclamou a ruiva, dando as costas para o casal. Podia até aplicar uma punição, mas estava muito atordoada no momento, por isso fingiu demência e sentou-se em uma mesa à janela, e observou bem a lua cheia surgindo no céu. Podia ser só sua imaginação, mas ao longe pensou ter ouvido um uivo.
Perto das sete, a garota levantou-se e foi em direção ao segundo andar, sala quatro.
— Alohomora! — apontou sua varinha para a fechadura da porta, olhando discretamente ao redor e entrando após isso. — Oi.
— Achei que você não vinha mais — murmurou Severus. O garoto colocou um marca texto no livro que tinha aberto no colo e o deixou de lado.
— Fui eu quem chamou você, Sev — retrucou Lily, revirando os olhos. — Tá lendo o que? — perguntou, ajoelhando-se ao lado do amigo no chão.
— Nada de mais.
— A incrível… — leu Lily, ignorando o amigo e alcançando o livro. — arte das maldições.
Severus teve a decência de parecer constrangido pelo menos, tirando o livro das mãos da amiga.
— Não é nada demais, Lils.
— Não é mesmo, não é? É basicamente o seu livro de cabeceira — resmungou indignada. — Me diga, já começou a pôr em prática? É isso que você e seus preciosos amigos fazem em suas reuniõezinhas secretas?
— Como podem ser secretas se você sabe delas? — sorriu Snape. — Nós não fazemos nada de mais, eu já te disse.
— Você tá me achando com cara de idiota, Sev? — esbravejou Lily, com a feição transtornada. — Fui eu quem aplicou a detenção para o Nott, caso você não se lembre. Zanzando pelo castelo com um bando de coisas suspeitas.
— Coisas suspeitas? — repetiu Severus zangado. — Não era nada demais, Lily. E você sabe por que ele estava zanzando pelos corredores aquela hora? Porque algum intrometido estava atrás dele!
— Oh! Claro, isso explica exatamente porque ele tinha aqueles ingredientes horrendos nos bolsos!
— Você sabe quem estava bisbilhotando nossas coisas, não é Lily? Sabe muito bem — continuou Severus, ignorando a ruiva.
— Potter, claro, sempre o Potter! — exclamou a ruiva com ironia. — Tadinho de você, não é, Sev? Não é como se você fizesse a mesma coisa com ele, né? Faça me o favor.
Manchas vermelhas horríveis cobriram o rosto do garoto de tanta raiva.
— Você está defendendo ele! Você sempre arruma uma forma, não é? — o tom de voz do moreno já estava alterado. — Por acaso agora mesmo você está interessada em saber o que ele está fazendo? Porque ele com certeza não está no quarto dele dormindo com o anjinho que você pinta!
— Não, Severus! Eu não estou nada interessada no que o Potter está fazendo, nem agora, e nem eu momento nenhum. Eu estou interessada no que você está fazendo com a sua vida!
E no calor do momento nenhum dos dois notou a figura esguia que os observava atentamente.