Nome da fic: Corações Acorrentados
Autor: Magalud
Par: Severo/Personagem Original
Censura: R
Gênero: Drama, Romance, Tema Adulto.
Spoilers: Eu alerto para spoilers em todos os livros
Resumo: Quando os pais de uma aluna morrem, ela descobre que não está desamparada
Agradecimentos: Jana, minha beta simpática!
Disclaimer: Esses personagens são de JKR, eu não quero nem vou ganhar dinheiro com eles.
Esta fic faz parte do SnapeFest 2004, e está arquivada no site e no meu site
Corações acorrentados
Capítulo 1 – Meu mundo caiu
Alguma coisa não estava nada bem.
Victoria Hennigan subiu as escadas de Hogwarts nervosamente. Não que ela fosse má aluna, mas um aluno ser chamado ao gabinete do diretor nunca tinha sido boa notícia.
Talvez alguém tivesse visto quando ela e Blaise Zabini tinham se encontrado na Torre de Astronomia. Ela não tinha deixado o colega sonserino "avançar o sinal", mas eles tinham se dedicado a "altos malhos" naquela noite. Ela até achava que poderia namorar Blaise, mas depois que eles "ficaram", ele não a procurou mais.
Victoria não podia fazer idéia do motivo que levara o Prof. Dumbledore a chamá-la naquela noite. Mal sabia ela que toda sua vida ia mudar.
Ao entrar no gabinete do Prof. Dumbledore, ela teve uma visão que a confortou: o chefe de sua casa, Prof. Severo Snape, estava lá também. Ele garantiria que, fosse qual fosse a encrenca na qual ela estava metida, ela teria um tratamento justo. Mas Minerva McGonagall também a encarava, com uma expressão que Victoria não conseguiu decifrar.
Como Blaise não estava lá, talvez aquilo não tivesse nada a ver com a Torre de Astronomia. Ela ficou um pouco mais tranqüila.
O Prof. Dumbledore disse:
- Por favor, minha criança, sente-se. Drops de limão?
- Não, obrigada – ela olhava para os professores, temerosa.
- Tenha calma, minha cara – disse o diretor – Você não está em encrenca. Pedi para vê-la porque algo aconteceu e não é nada bom. Como você sabe, faz alguns meses desde que Voldemort foi derrotado. Desde então os seus seguidores remanescentes vez por outra promovem ataques contra aqueles, que, como sua família, estiveram lutando pela causa da Luz.
Victoria arregalou os olhos:
- Houve um ataque?
O Prof. Dumbledore parecia triste e cansado, e chegou perto dela:
- Lamento, mas houve um ataque sim, Victoria. Seus pais... eles não sobreviveram.
Jamais Victoria tinha tido um choque tão grande. Ela ficou até meio aparvalhada, o coração acelerado:
- Eles... morreram? Meus pais morreram?
- Eu sinto muito, minha querida –disse a Profª McGonagall.
Por um minuto, Victoria sequer sabia como reagir, e foi nesse minuto que um frasco de poção apareceu diante dela. O Prof. Snape a encarava, oferecendo o frasquinho. Ela tomou o líquido e reconheceu asfódelo. Sem perceber, as lágrimas já caíam em seu rosto.
- Prof. Dumbledore – ela disse, em lágrimas –, Voldemort matou toda a minha família. Eu só tinha meus pais. Agora eu não tenho ninguém. O que vai ser de mim?
O diretor de Hogwarts disse:
- Você não ficará desamparada, Victoria, pode ter certeza. Já começamos a tomar providências.
McGonagall passou as mãos em volta dos ombros da moça, abraçando-a. Victoria tinha 17 anos, mas até completar 21 anos, não era considerada adulta ou emancipada. Sem ter parentes ou tutores, ela seria mandada para um orfanato. No mundo dos bruxos, o orfanato tinha o nome de A Casa do Jovem Bruxo, e diziam que era um local assustador, com delinqüentes e uma disciplina draconiana, algo retirado de um livro de Dickens.
Ela choramingou:
- Eu não quero ir para o orfanato!
- Não se preocupe, minha criança – disse o Prof. Dumbledore – Cuidarei para que isso não aconteça. Agora o Prof. Snape vai levá-la para a enfermaria. É melhor você passar a noite lá. Amanhã de manhã arranjaremos um jeito para você ir aos funerais. Acredito que você queira dar o último adeus a seu pai e sua mãe.
- Sim, professor.
- E tente não se preocupar, minha querida.
Sob efeito da poção, ela dormiu sem problemas, e no dia seguinte foi levada para os funerais, a Profª McGonagall representando o diretor de Hogwarts.
Victoria sentia-se como se estivesse num filme, assistindo àquilo tudo como se fosse uma outra pessoa. Não que ela não tivesse aceitado o fato, mas era difícil dar adeus. Despedir-se dos pais significava dar adeus a sua vida até aquele momento. Ela não tinha idéia do que seria dela ou de sua vida dali para frente.
Emocionalmente, Victoria não estava tão devastada quanto poderia estar. Claro que Madame Pomfrey tinha lhe dado poções para ajudar, mas a perda de seus pais sempre tinha sido meio que presente na vida de Victoria desde que ela teve idade suficiente para entender as coisas. Sua família era de origem sonserina e contrária a Voldemort, e a ameaça sempre tinha estado presente. Desde muito pequena, ela recebera dos pais as instruções e avisos de que ser contra Voldemort era perigoso – e a favor de Voldemort também não era mais fácil.
Na verdade, Victoria tinha crescido vendo sua família ser dizimada paulatinamente por Comensais sequiosos de vingança. Ela era uma menina quando os pais primeiro lhe explicaram sobre o bruxo mau que ameaçava a todos. Quando Harry Potter finalmente derrotou Voldemort pela segunda vez, ela acreditou que tudo tinha acabado, que o mundo finalmente estava seguro para se viver. Jamais lhe passara pela cabeça que Comensais restantes pudessem acabar com sua vida deste modo.
Sentiria muita a falta de seus pais, que a amavam muito e a quem amava com grande carinho. Ela não tinha irmãos, nem tios, nem primos, nem ninguém. Estava sozinha no mundo.
Ao voltar para Hogwarts, foi conduzida ao escritório do Prof. Dumbledore mais uma vez. Novamente, assim que entrou, viu um grupo de pessoas à sua espera: o Prof. Dumbledore, a Profª McGonagall, o Prof. Snape e um homem que ela não conhecia. Ele era baixinho, magrelo e careca; estava enfiado numa capa preta surrada e usava uma gravata borboleta vermelha.
- Entre, Victoria, entre – convidou o Prof. Dumbledore – Eu tenho aqui umas ótimas balinhas de menta. Gostaria de uma?
- Não, obrigada, senhor – disse ela – Eu estava indo para minha aula de Feitiços.
- Oh, isso pode esperar. Você acabou de passar por uma experiência terrível com grande bravura. Nenhuma criança deveria ser obrigada a assistir os funerais dos próprios pais.
Aquilo fez Victoria voltar a ficar com os olhos cheios de água. Ele continuou:
- Eu a chamei aqui, Victoria, porque sua vida vai mudar, como você já deve ter percebido. Mas como eu disse antes, você não vai ficar desamparada.
- Não vão me mandar para o orfanato?
- Não, não, querida, não. Seu pai foi muito previdente e tomou providências para o caso de um dia Voldemort conseguir derrotá-los e você ficar órfã. Ele deixou um documento que só deveria ser aberto no caso da morte dele e de sua mãe.
- Um documento?
- Um contrato – ele se virou e mostrou o baixinho – Esse é o Sr. Bannister, advogado de seu pai. Ele acabou de retirar o contrato do cofre de sua família no Banco Gringotts. Ele me deu a boa nova: você vai ter um responsável. Bem, na verdade mais que isso. Esse contrato foi assinado quando você ainda era uma criança, e a ameaça de Voldemort poderia deixá-la órfã numa idade ainda mais tenra. Foi para evitar que você fosse levada para um orfanato que seu pai fez esse contrato nomeando um responsável.
Victoria indagou:
- Esse responsável vai ser meu tutor, como uma governanta?
O Prof. Dumbledore enrubesceu:
- Não, na verdade não é essa a natureza do contrato que seu pai deixou. É um contrato de casamento.
- Casamento? – ela olhou para o advogado – Com ele?!
Dumbledore tentou explicar:
- Agora tenha calma, Victoria. O contrato prevê que você tem opção de se divorciar ao completar 19 anos, um ano depois de alcançar a maioridade, se assim desejar. Contudo, até lá, você deverá cumprir todos os requisitos do casamento.
Victoria olhou para o baixinho e começou a se assustar com o que estava ouvindo. Ela procurou ter certeza:
- Professor, o que isso quer dizer?
Todos os adultos presentes se mexeram, desconfortáveis, evitando olhar diretamente para a garota. A Profª McGonagall apertou os lábios com força, e o Prof. Snape não só tinha uma aparência mais pálida do que de costume, mas também parecia estar com seu humor especialmente ruim. O Prof. Dumbledore olhou para a menina, cheio de compaixão, e disse:
- Isso quer dizer que o casamento será real em todos os sentidos, Victoria. Não será um casamento de aparências. Você poderá obter o divórcio mais tarde, como eu já disse, mas enquanto for casada, deverá ser uma esposa verdadeira, não apenas fingir ser uma.
As implicações do que ele disse atingiram Victoria em cheio. Lágrimas começaram a cair:
- Mas... não tenho escolha? Não existe alternativa?
- Lamento, mas não há, Victoria. O contrato força você e seu marido a essa situação.
Ela olhou o advogado, ainda chorando:
- Como ele vai ser meu marido? Eu não tenho nem namorado! Eu nunca sequer namorei firme!
A Profª McGonagall sentou-se ao lado dela e Victoria se sentiu tão confortada que se arrependeu de um dia tê-la chamada de galinha velha. O Prof. Dumbledore disse, suavemente:
- Você parece estar sob a errônea impressão de que o Sr. Bannister é o contratante. Isso não é verdade. O contrato firmado prevê seu casamento com o Prof. Snape.
Victoria ficou tão surpresa que sequer conseguiu falar. Ela jamais poderia ter imaginado algo assim. O que seu pai tinha feito? Não, não! Isso não podia estar acontecendo!
Mas estava, e como toda sonserina, ela rapidamente encarou a realidade. Ela olhou para o Prof. Snape por entre as lágrimas e viu-o de uma maneira diferente do que o via todos os dias: como um homem. Viu os cabelos em desalinho, as capas bem negras, a veste de lã cinza, os botões forrados, e finalmente o nariz em gancho, debaixo de olhos bem pretos e bem brilhantes...
Seu futuro marido.
Percebendo o silêncio constrangedor, Victoria fez a pergunta que lhe pareceu mais óbvia no momento:
- O senhor quer se casar comigo, professor?
Numa voz suave que ela nunca tinha ouvido, ele suspirou e respondeu:
- O que eu quero ou o que você quer pouco importa. O contrato foi firmado e ele precisa ser cumprido.
Ele tinha razão. Victoria assentiu e enxugou as lágrimas. Por dentro, ela começou a se acalmar – um pouco. Pelo menos, ela confiava no seu diretor de casa. Claro, casar com ele jamais tinha passado pela cabeça, mas ao menos ela sentia que não precisava ter medo dele.
O Prof. Dumbledore interrompeu seus pensamentos:
- A cerimônia de oficialização será realizada hoje à tarde. Até lá, Victoria, você deverá providenciar a sua mudança para os aposentos do Prof. Snape. A partir de amanhã, a Profª Sinistra será sua nova professora de Poções. A Profª McGonagall lhe dará os novos horários amanhã no café da manhã. Hoje você deve se preparar para o seu casamento. O Sr. Bannister vai acompanhar a cerimônia como testemunha e vai verificar o cumprimento do contrato.
Victoria arregalou os olhos:
- Mas já? Não pode esperar um pouco? Sabe, até nós nos acostumarmos à idéia?
O diretor de Hogwarts disse pesadamente:
- Isso fere os termos do contrato. Por isso o Sr. Bannister está aqui. Se vocês não estiverem casados ainda hoje, o contrato pode ser declarado quebrado. Neste caso, você será retirada de Hogwarts e levada à Casa do Jovem Bruxo.
Aquilo foi o balde de água fria na última esperança de Victoria. Ela iria se casar em poucas horas, e todos os adultos a encararam, como que à espera de uma reação. Victoria enxugou as lágrimas de novo e suspirou, dizendo:
- Sim, Prof. Dumbledore.
Ele deu um tapinha no braço dela, tentando confortá-la:
- Muito bem, minha brava criança. Vou pedir aos elfos domésticos que mudem seus pertences para os aposentos do Prof. Snape o quanto antes.
A Profª McGonagall se adiantou:
- Eu irei mais tarde para transfigurar um lindo vestido para o seu casamento. Poderemos conversar, se você quiser.
- Obrigada, professora – Victoria se sentia realmente grata. Ela gostaria muito de conversar com alguém sobre tudo que estava acontecendo.
- O Prof. Snape vai levá-la até sua nova casa – disse o diretor – E parabéns ao jovem casal.
Cada vez que o Prof. Dumbledore abria a boca, ela parecia estar mais perto do inevitável. Contudo, era essa sua nova realidade. Ela deveria aceitar isso o quanto antes.
Foi com pernas trêmulas que Victoria seguiu o Prof. Snape até a masmorra embaixo do lago, onde ficavam seus aposentos. Eles andaram em silêncio, seus passos ecoando pelos corredores de pedra, perdidos em pensamentos.
O Prof. Snape parou em frente a seus aposentos, tirou a varinha e recitou um encantamento que Victoria não conhecia. Em seguida, ele anunciou:
- Agora as proteções vão reconhecer você. Não será preciso usar a senha para entrar.
Victoria entrou nos aposentos do professor mais temido de Hogwarts com um sentimento de desastre iminente. Ali seria seu novo lar. O que ela viu foi uma sala com um sofá em frente à lareira, uma grande escrivaninha no canto, abarrotada de cadernos e pergaminhos.
- Este é meu escritório particular – ele mostrou as outras portas – Ali fica meu laboratório privado. Adiante está o quarto de dormir e o banheiro é contíguo. No momento, estou atrasado para uma aula, mas acredito que teremos chance de conversar mais tarde, depois... – ele hesitou – da cerimônia.
Victoria assentiu:
- Sim, senhor.
- Victoria – ela não estava acostumada a ouvi-lo falar seu primeiro nome –, aqui neste aposento você pode me chamar por meu primeiro nome. Fora daqui, eu volto a ser o Prof. Snape e você será a Srta. Hennigan, apesar da sua mudança de estado civil. Essa situação só perdurará até a formatura, quando a senhorita deverá se mudar para a mansão de minha família.
- Sim, senhor – corrigiu-se. – Quer dizer, Severo – Victoria ficou constrangida. – Vai ser difícil eu me acostumar.
Ele disse, a voz sempre com aquele tom suave que ela não estava acostumada:
- É compreensível. Agora vou lhe dar uma parte do closet para colocar suas roupas. Depois poderemos fazer arranjos mais confortáveis para ambos.
Ele entrou no quarto, e Victoria seguiu-o, surpreendendo-se com o que viu. Era um aposento amplo, dominado por uma grande cama de casal com quatro postes nus, sem tecidos ou dosséis. À direita, embutido nas paredes de pedra, estava o closet; à esquerda, a porta do banheiro, e em frente à cama, uma outra lareira.
Snape tirou a varinha e apontou para o closet: várias roupas saíram das prateleiras, trocaram de lugar e abriram uma grande seção interna. Victoria observou, impressionada pela austeridade que jamais imaginou existir na intimidade de seu diretor de casa.
- Acredito que esse espaço seja o suficiente por enquanto. Como eu disse, futuramente poderemos fazer outros arranjos mais a seu gosto. Agora preciso voltar para a sala de aula.
- Claro, professor.
Ele parecia relutante, e disse, levemente constrangido:
- Vou deixá-la à vontade para se preparar para a cerimônia. Pode almoçar no escritório, se quiser. Talvez fosse mais aconselhável evitar seus colegas nesse momento.
- Sim, senh- quero dizer, sim, Severo.
Ele saiu e ela ficou no aposento, olhando para aquelas paredes estranhas, sabendo que teria que se familiarizar rapidamente com tudo aquilo. Lágrimas voltaram a seus olhos, mas ela não saberia dizer por quê. Havia tanta coisa em sua mente que ela tinha dificuldade em separar seus sentimentos.
Após o que pareceram ser apenas alguns minutos, uma batida surgiu à porta e Victoria foi atender, ainda sentindo-se uma estranha num lugar ao qual não pertencia.
Era a Profª McGonagall.
- Olá, querida. Está sozinha? Suas coisas já chegaram.
E era verdade. Ao lado da porta, estava seu malão e algumas caixas com pertences pessoais. Victoria disse, começando a carregar para dentro:
- Oh, eu não percebi. O Prof. Snape foi dar uma aula e eu devo arrumar minhas coisas nesse meio tempo.
- E você ainda nem almoçou, como eu verifiquei. Já passou da hora do almoço no Grande Salão faz tempo.
Victoria ficou surpresa:
- Eu não percebi. Não estou com fome. Acho que tenho muita coisa na cabeça – Então percebeu que a professora ainda estava na porta. – Por favor, entre.
- É natural que esteja um pouco... dispersiva – disse a professora, entrando. – Sua vida mudou de maneira radical e abrupta. Você tem se portado muito bem, considerando as circunstâncias.
- Será, professora? – Victoria suspirou. – Parece que isso tudo é um sonho e que daqui a pouco vou acordar na minha cama lá em casa e meus pais vão me dar uma bronca por dormir até mais tarde!
As últimas palavras ela disse chorando, e em seguida afundou o rosto nas mãos, soluçando. Penalizada, a Profª McGonagall sentou-se ao lado dela no sofá.
- Srta. Hennigan... Victoria. Eu calculo como isso tudo deve estar sendo duro para você. Acho que vai precisar conversar com alguém sobre isso. Se quiser que eu chame alguma de suas amigas, ou algum outro professor com quem se sinta mais à vontade...
- Não, por favor, não vá. Fique comigo. A senhora parece se importar com o que acontece comigo.
- Todos nós estamos muito preocupados com você, Victoria.
- Professora, por que meu pai fez isso comigo? Por que ele me casou por contrato com alguém tão mais velho?
- Tenho certeza de que seu pai estava preocupado em mantê-la em segurança, junto a alguém em quem o Prof. Dumbledore confia. De qualquer modo, eu acho que seria bom você conversar com o Prof. Snape a esse respeito. Ele deve saber melhor do que eu sobre esse assunto. Acredite apenas em duas coisas: a primeira é que você não está sendo punida. Afinal, seu pai só fez o que achou ser melhor para você. E acredite também que o Prof. Snape não é nenhum vilão. Ele está preso a esse contrato do mesmo modo que você.
- Mas é tão estranho! – desabafou ela – Digo, ele é um professor – meu professor.
- Ex-professor, não se esqueça. Madame Sinistra vai ensiná-la Poções daqui para frente.
- A senhora sabe o que eu quero dizer. Ele vai ser meu marido. Eu vou ter um marido! Eu nunca nem sequer tive um namorado na minha vida!
Pacientemente, McGonagall disse:
- Tenho certeza de que com esforço e boa vontade, você poderá superar a falta de experiência. Com certeza o Prof. Snape terá paciência. Diga-me: você odeia o Prof. Snape, por um acaso? E não precisa se preocupar: eu não vou repetir nada do que disser para ninguém. Pode ser sincera.
- Não, eu não o odeio. Ele é o diretor da minha casa e cuida de nós muito bem. As outras casas nos odeiam, e só temos ele a quem recorrer – então ela olhou para McGonagall, ficou vermelha – Er... desculpe por dizer. Eu não devia ter falado.
- Não vou julgá-la – disse a professora. – Mas fico feliz em saber que você não tem medo dele.
Victoria ficou ainda mais vermelha:
- Mas... eu tenho...
- Medo dele? Mas não foi o que pareceu. Por quê?
- É que – ela parecia não parar de ficar vermelha – O Prof. Dumbledore disse que o casamento tem que ser de verdade. Então eu e ele vamos ter que... fazer... coisas.
Os lábios e McGonagall formaram um perfeito "O" e ele assentiu, com uma compreensão pesarosa. Abaixando a voz, ela indagou:
- Mas você foi às aulas de Educação Sexual com Madame Pomfrey, não foi?
- Sim, mas... eu vou ter que fazer, er... sexo... com ele. Eu nunca fiz. Eu sei como é, mas nunca fiz. E vai ser com ele!
- Agora, minha querida – disse McGonagall, tentando acalmá-la. – Entendo que se sinta insegura. Mas tente explicar a situação a seu marido. Sabe, as pessoas podem dizer muita coisa sobre o Prof. Snape, mas ele é um cavalheiro e vai tratá-la como uma dama deve ser tratada. Ele vem de excelente família, e eu sei o quanto sonserinos valorizam isso numa pessoa.
- Eu tenho medo, professora.
- Do Prof. Snape?
- De tudo isso! Eu não vou conseguir, eu sei que não.
- Tenha calma, querida. Você está indo muito bem. Não há nada para se apavorar. Casamentos arranjados podem ser um tanto constrangedores de início, mas com boa vontade e esforço, as coisas podem tomar jeito. Procure conversar com seu marido, negociar o que vocês querem desse casamento.
- Ele disse que quer falar comigo hoje.
- Isso é um bom sinal. Mas antes de falar com ele, pergunte-se o que você quer desse casamento. Seja sincera. Se você não quer que esse casamento dure além do prazo mínimo, diga isso a ele. Mas dê uma chance ao seu coração de saber o que quer.
- Sim, senhora.
- No momento, porém, devemos nos concentrar em deixar você bonita para sua cerimônia de união. Antes de qualquer coisa, almoço. Depois um banho, e eu vou transfigurar um vestido do jeito que você quiser.
- Eu ouvi dizer que as noivas trouxas casam de branco. Isso é verdade?
- Sim, é isso mesmo. E está na moda bruxa.
- O que a senhora acha?
- Você ficaria linda num vestido branco de noiva, Victoria. Vamos ver o que podemos fazer.
Capítulo 2 – A nova vida
E linda ela realmente ficou. Depois de uma tarde inteira de trabalho, a hora chegou. Naquela noite, uma breve cerimônia, testemunhada por alguns dos professores e o Sr. Bannister, oficializou o casamento de Severo A. Snape e Victoria Ann Hennigan, que passou a se chamar Victoria Snape. O Prof. Dumbledore em pessoa conduziu o ritual simples e ofereceu aos noivos um feitiço especial para aumentar a proximidade do casal. O Prof. Flitwick também encantou as alianças com vibrações de harmonias para os noivos.
Em seu vestido branco de detalhes rosa, com rendas nos punhos e nas barras, Victoria era um sonho de noiva trouxa. Os cabelos compridos castanhos estavam presos a um coque pontilhado de flores brancas. Brincos e colar de cristal rosa combinavam com os detalhes do vestido. O Prof. Snape tinha optado por um elegante paletó cinza, camisa de gola alta e gravata em nó, com botas pretas. O cabelo dele tinha sido lavado e estava sedoso e brilhante. Victoria surpreendeu-se com a aparência do homem a quem a partir daquele instante chamaria de marido.
Após a cerimônia, os noivos foram convidados a uma recepção perto do Salão Principal, exclusiva para os professores e para os alunos de sétimo ano. Só então Victoria pôde ver seus amigos e colegas. Foi cercada pelas meninas, que numa algazarra típica de adolescentes, queriam ver as alianças, comentar sobre o vestido, fofocar sobre a reviravolta em sua vida. Ao falar com suas amigas Angela, Kathy e Jenny, ela olhava para o Prof. Snape, por um canto do olho, e viu a reação dele. Obviamente, um bando de ruidosas adolescentes aos gritinhos não o deixou nada contente.
O tempo pareceu voar diante de Victoria, até que a festa foi encerrada e todos começaram a voltar para suas casas e dormitórios. Nessa hora ela se deu conta de que sua vida de casada iria começar.
Ao entrar nas masmorras, acompanhada por Snape, ela se sentiu extremamente constrangida. Mas logo tentou dizer a si mesma que não deveria ficar. Afinal de contas, aquele homem era seu marido.
- Talvez fosse aconselhável você se preparar para dormir.
- Sim, senhor. Quero dizer, Severo.
Os dois entraram no quarto, e ele retirou o paletó, dizendo:
- Se preferir conversar, podemos fazer isso também.
Victoria se sentiu aliviada e sentou-se na cama:
- Sim, eu gostaria disso – ela olhou para ele e enrubesceu – Obrigada.
- Por quê?
- Por estar sendo bom comigo.
- Ao contrário do que reza a lenda em Hogwarts, eu não sou um monstro. Há que se acrescentar que você é minha esposa agora. Mas também quero que saiba que não tenho intenção em tornar esse casamento mais difícil para nós do que ele já é.
- Professor, posso fazer uma pergunta?
- Não me chame por meu título.
- Claro, desculpe. Severo, posso fazer uma pergunta? Gostaria de saber como meu pai fez esse contrato. E por que ele fez isso?
- Ora, o motivo é óbvio. Ele queria deixá-la protegida no caso de uma morte prematura. O contrato previa que o Sr. Bannister arranjaria um tutor para você até completar 16 anos, idade em que poderia se casar.
- Meu pai fez o contrato com o seu pai?
- Não, foi comigo mesmo. Meu pai – ele hesitou, sentando-se na cama – era seguidor do Lord das Trevas e morreu logo depois. Você era muito pequena.
- Por que você aceitou esse contrato?
- Seu pai me fez um favor muito grande, e provavelmente salvou minha vida. Ele era um dos poucos sonserinos que estava do lado da Luz e usou sua influência junto a Dumbledore para convencer o Diretor que minhas intenções em combater o Lord das Trevas eram verdadeiras. Mais tarde, quando ele me pediu o favor de aceitá-la como minha prometida em casamento, eu não pude recusar. À medida que você crescia e eles estavam seguros, eu considerei que o contrato dificilmente seria cumprido. Quando Harry Potter livrou o mundo bruxo do Lord das Trevas, eu achei que o contrato iria se tornar naturalmente nulo, pois você chegaria à maioridade com seus pais vivos. Infelizmente não foi o que aconteceu. Eu sinto por sua perda.
- Então você não quis se casar comigo?
- Acredito que o contrário seja verdadeiro. Não tenho ilusões de que você quisesse, espontaneamente, casar-se com um homem de minha idade, odiado por toda a escola, ex-Comensal da Morte, de humor duvidoso e sociabilidade ainda mais controversa. Por isso entendo que esteja ansiosa pelo seu 19 aniversário, quando poderá pedir o divórcio e se ver livre de mim. É minha intenção não tornar essa exigência contratual mais desagradável do que já é. Não tenho ilusões de que venha a ter sentimentos a meu respeito, e só exigirei alguns poucos deveres conjugais. No mais, deixarei que desfrute de relativa privacidade.
- Oh – fez Victoria – Agradeço.
Snape se emendou:
- Claro, se minha presença se tornar muito insuportável para você, poderemos pensar em anular o contrato e o casamento.
- Não, por favor. Eu... gostaria de tentar. O senhor parece estar se esforçando, é apenas justo que eu faça o mesmo também.
- Muito bem então – ele se ergueu e assumiu uma postura como se estivesse prestes a começar uma aula de uma poção particularmente difícil – É melhor avisar que não sou uma pessoa fácil de conviver. Muito da minha reputação é verdadeira. Quando trabalho, não gosto de ser perturbado. Meu temperamento é conhecido e, como já disse, a fama é totalmente justificada. Como seu marido, não exigirei sua presença em eventos sociais que não queira ir, ou fora do âmbito acadêmico. Se desse casamento resultarem filhos, eles levarão o nome Snape não obstante o divórcio. Não lhe exigirei intimidade por enquanto, mas lembre-se de que esse casamento não é apenas de aparência.
Ela prestava uma grande atenção e disse:
- Entendo, Severo.
- Até o final do ano – continuou ele –, continuaremos a morar em Hogwarts. Depois nós nos mudaremos para a mansão de minha família. Claro que passarei muito tempo em Hogwarts, mas tentarei dedicar tempo a você e à Mansão Snape. Você estará formada e poderá se dedicar ao que quiser.
- Você... quer filhos?
- A idéia de um herdeiro não me desagrada. Jamais tinha pensado em ter um, obviamente, mas essa pode ser minha última chance. Afinal, depois do divórcio, é razoável presumir que jamais me casarei novamente.
- Por quê?
O rosto dele endureceu:
- Não seja tola, Victoria. Você só se casou comigo obrigada, então por que supor que alguém faria isso de livre e espontânea vontade?
Victoria ficou penalizada ao ouvir o que aquele homem pensava de si mesmo – e sentiu-se culpada, como se tivesse ajudado de alguma forma a que ele tivesse essa imagem de si mesmo.
Seu marido a devolveu à realidade:
- Se quiser, poderemos falar mais numa outra hora. Agora é melhor irmos dormir.
- Está bem. Obrigada por isso.
Victoria foi ao banheiro, sentindo-se constrangida e tola por agradecer tanto. Com dificuldade, tirou sozinha o vestido de noiva, optando por uma camisola comprida para dormir. Ao sair do banho, Snape estava enfiado num camisolão preto. Ela tremeu um pouco, pensando que teria que se tornar íntima daquele homem.
Ele se enfiou debaixo das cobertas enquanto ela guardava suas roupas e retirava a maquiagem. Depois, constrangida, ela também se enfiou na cama – o mais longe possível dele.
- Assim você vai cair da cama.
- Não, estou bem – mentiu ela.
- Não seja tola, menina. Eu não vou tentar me aproximar de você até que esteja pronta.
- Mesmo?
Ele suspirou.
- Não tenho a menor intenção de estuprá-la na noite de seu casamento. Discutiremos seus deveres maritais quando chegar a hora.
Ela se sentiu tão aliviada que sorriu:
- Oh, obrigada.
E mais uma vez ela agradecia!
- Agora vá dormir – disse ele – Você teve um dia cheio.
Era verdade. Só depois de dar boa-noite e estar quase deslizando para um sono pesado, ela se deu conta que no mesmo dia tinha enfrentado o enterro de seus pais e seu próprio casamento.
Victoria sentia-se deitada numa nuvem de calor e segurança envolvendo seu corpo. Quando abriu os olhos, demorou a entender o que se passava.
Ela estava nos braços do Prof. Snape. Durante a noite, ela tinha se mexido e procurado o calor do corpo dele, aninhando-se com satisfação nos braços de seu marido.
O susto foi tamanho que ela deu um pulo para trás. O movimento o acordou e ela enrubesceu:
- Er... bom dia – ele continuou encarando-a, como se esperasse uma explicação – Achei que estava atrasada e me assustei.
Era uma mentira, e ele percebeu, mas não se deteve nisso:
- Eu a teria acordado. Espero que tenha dormido bem. Pode usar o banheiro primeiro.
Constrangida, Victoria procurou seu uniforme e dedicou-se à sua higiene matinal. Os dois recém-casados se envolveram nas atividades do dia experimentando algum acanhamento e depois subiram juntos ao Salão Principal. Assim que entrarem, as conversas pararam e todas as cabeças se voltaram para eles. Vermelha, Victoria ouviu seu marido dizer:
- Bom, tenha um bom dia.
Ele deu um ligeiro toque nas costas dela antes de ir para a mesa dos professores, e ela logo se dirigiu para a mesa de Sonserina. Assim que ela sentou, foi cercada pelas amigas, todas cheias de perguntas, animadíssimas com o casamento dela. Mas Victoria ainda não sabia direito como se sentia. Tudo tinha sido tão rápido.
- E como foi a lua-de-mel?
- Jennie, isso é lá pergunta que se faça? – ralhou Kathy.
- Ora, o que tem de mais? A gente precisa saber como é.
Angela disse:
- Olhe, você e Roger Corman já fizeram tudo que precisavam para saber como é.
- É, mas Vic fez com um homem de verdade!
Victoria disse, tentando disfarçar o fato de que não tinha feito coisa nenhuma:
- Olhe, gente, não fica bem ficar comentando.
- Aiiiiiiii que romântico!
- Psiu! Fala baixo! Snape já está olhando para cá.
- Mostra de novo a aliança.
Blaise Zabini se aproximou do grupo:
- Oi, Victoria.
- Oi, Blaise.
- Ainda não pude cumprimentá-la pelo casamento. Estão todos impressionados, só se fala nisso.
Ela não sabia o que dizer:
- Pois é, eu me casei.
- Olhe só – ele olhou para as demais meninas, que de repente passaram a olhar para as unhas, mexer no cabelo, virar para o outro lado. Blaise abaixou a voz – Victoria, se o seu casamento tem alguma coisa a ver com a gente não ter dado certo... eu... olha, me desculpe.
- Não, Blaise, não tem nada a ver com você.
- Eu estava interessado. A gente podia ter namorado.
- Agora não vale muito a pena pensar nisso, né?
- Mas a gente pode ser amigo. Eu quero muito ser seu amigo.
- Claro, Blaise. Podemos ser amigos.
- Legal – disse ele, virando para trás – A gente se vê na aula.
Assim que ele estava fora do alcance de voz, as três meninas atacaram Victoria como gaviões caindo em cima de uma presa:
- Nossa! Vocês viram a cara dele?
- Estava morrendo de ciúmes! Dava para ver.
- Vocês estão exagerando.
- Que nada! Vic, acho que ele está a fim de você.
- Como você tem sorte! Pode ter um marido e um amante!
- Não é nada disso! – protestou Victoria – Ele só falou em amizade. Quer ser meu amigo, só isso.
- Uau! Será que os dois vão duelar por causa da Vic?
- O Prof. Snape iria massacrar o Blaise!
- Aiiiiiiiii isso é tão romântico!
- Pára de dizer isso! Não tem nada a ver.
A chegada da Profª McGonagall interrompeu as adolescentes:
- Srta. Hennigan, aqui estão seus novos horários. A Profª Sinistra vai lhe dar Poções num horário extra às quartas-feiras.
- Sim, senhora.
- Tenham um bom dia. E não se atrasem para a primeira aula.
O dia passou, ainda parecendo que tudo aquilo não era muito real, e Victoria quase se esqueceu de que era uma mulher casada. No final do dia, ela quase foi para o dormitório da Sonserina, como era de costume. Já estava perto da entrada do salão comunal, quando deu meia-volta e foi até os aposentos do Prof. Snape.
Ele estava no laboratório e ela ocupou a escrivaninha do escritório para estudar as matérias do dia. Quando ele emergiu do laboratório, ela estava quase terminada com suas lições.
- Olá – sorriu Victoria – Como foi o seu dia?
Ele não retribuiu o sorriso:
- Ensinando um bando de cabeças-ocas, como sempre. O seu?
- Tentando deixar de ser uma cabeça-oca – ela voltou a sorrir – Já está quase na hora do jantar. Vem comigo?
- Sim, claro.
Mais uma vez eles chegaram juntos ao Salão Principal, e as cabeças se viraram, mas as conversas não diminuíram. Depois do jantar, eles desceram para as masmorras, onde os dois ocuparam a escrivaninha para terminar seus deveres: Snape corrigia redações, e Victoria fazia o resto de suas lições de Artimancia. Na sua letra miúda e garranchada, ele distribuía notas baixas e comentários sarcásticos, ela notou.
- Vou pedir aos elfos domésticos que providenciem uma escrivaninha para você ficar mais confortável.
Ela gesticulou para a pilha de pergaminhos ao lado dele:
- Eu não quero atrapalhar.
- Não está atrapalhando.
- Então posso ajudar?
Snape piscou lentamente:
- Quer ajudar?
- Claro. Você parece estar sobrecarregado.
- Conhece as propriedades da pedra da lua?
- Foi minha melhor redação no quinto ano. Conheço tudo sobre isso.
Ele passou uma pilha de manuscritos e tinta vermelha, dizendo:
- Divirta-se. Qualquer dúvida pode me consultar.
Victoria viu-se diante de uma pilha de redações do quinto ano e passou a corrigi-las com afinco, feliz de poder ajudar.
- Posso fazer comentários?
- Fique à vontade. Mas rubrique-os.
Ela convencionou assinar um pequeno V ao pé do pergaminho. Quando terminou, viu que Snape lia alguns de seus comentários com um meio sorriso.
- Bastante satisfatório.
- Vindo de você é um elogio.
- Foi gentil de sua parte.
- Fiz com prazer.
- Agora vamos dormir?
- Pode ir. Tenho outros afazeres a terminar.
- Oh, que pena. Mas está bem.
Ela se enfiou na cama e, cansada, dormiu. Estava dormindo quando Snape se deitou. Estava dormindo quando seu corpo procurou o calor do dele. Foi a vez de Snape ficar intrigado. Mas não se separou dela. Abraçados, os dois dormiram a noite inteira – o que, no caso de Snape, era virtualmente inédito.
De manhã, houve novamente o constrangimento ao acordar nos braços de Snape. Mas aquilo era tão bom, pensou Victoria, preferindo por uns minutos fingir estar dormindo. Mal sabia ela que seu marido também estava acordado, igualmente fingindo que dormia. Quando Victoria abriu os olhos, ele parecia dormir e admirou-o por alguns minutos, hipnotizada pela visão do marido de olhos fechados: ele parecia calmo e sereno, e talvez até mais jovem. Ela teria ficado mais tempo a admirá-lo, mas temia ser descoberta. Com cuidado ela se desvencilhou dos braços dele e dirigiu-se ao banheiro.
Ao ouvir o barulho da porta, Snape abriu os olhos, sentindo a falta do corpo dela em seus braços, a ausência do seu calor, seu perfume suave. Ele preferiu não pensar no quando os seus sentidos tinham se aguçado e sentiu um problema se apresentando: uma insistente ereção bastante inoportuna. Respirando fundo, ele esperou, imóvel até que ela desaparecesse. Ele previu que o "problema" poderia se repetir eventualmente, e para não constranger sua esposa, seria bom ele cuidar disso – sozinho, concluiu amargamente.
Foi nesse momento que Victoria emergiu do banheiro, já de banho tomado e uniforme. Ela viu que ele a encarava e sorriu:
- Bom dia.
- Vejo que levantou cedo. Dormiu bem?
- Muito bem, obrigada – ela guardou a camisola – Há tempo de tomar um banho antes do café. O banheiro está livre.
- Agradecido.
Naquela manhã, os dois estavam menos constrangidos um com a presença do outro.
Nas semanas que se seguiram, grande parte da tensão entre os dois se diluiu sem que eles percebessem. Foi naturalmente que eles chegavam ao Salão Principal e a mão de Severo estava nas costas de Victoria. Sem sentir, eles estavam mais próximos fisicamente, trocando olhares que ninguém, a não ser eles dois, perceberam. Uma relação incipiente começava a se desenvolver.
Então não foi de espantar que numa noite fria, um novo passo foi dado. Victoria lia um romance em frente à lareira e Snape chegou na frente dela com duas taças;
- Gostaria de tomar um cálice de vinho comigo?
- Eu nunca tive permissão para beber álcool.
- Você é uma mulher casada, com idade e atitude para consumir álcool com responsabilidade. É um bom vinho.
Victoria sorriu:
- Então vou experimentar.
Snape serviu uma taça e passou-a a Victoria, sentando-se a seu lado. Ela tomou a taça das mãos deles e bebericou um pouco.
- Hum – fez – Bom – e bebeu mais um pouco.
- Vá com calma – recomendou – Isso não é suco de abóbora.
- Está bem. Não posso me embebedar: tenho aula amanhã cedo!
Ela sorriu de sua própria piada, e Snape não retribuiu, reparando que os lábios dela estavam avermelhados do vinho. Ele notou isso e seu corpo reagiu. Mas ele nem tinha bebido nada, portanto, não era efeito do vinho.
- Isso é bom – repetiu Victoria – Quanto posso beber sem ficar bêbada?
- Você não está acostumada a beber, então é bom não abusar. Um copo deve bastar.
- Hum, ajuda a esquentar a gente por dentro. Estou ficando rosada – ela parecia descobrir um mundo novo.
- Tenha cuidado. Álcool dá uma sensação de falsa euforia.
- Acho que entendo o que quer dizer.
- Talvez fosse bom beber um pouco de água para diluir esse efeito – ele conjurou um copo e entregou-o a ela.
- Obrigada – ela tomou um gole – Você é muito gentil. Sabe, nem todos são tão gentis com a esposa, pelo que ouvi falar.
- Eu disse que pretendia tornar essa experiência o menos indolor possível. Mas há certas coisas das quais não se pode fugir, Victoria.
Ela sentiu uma mudança de tom na voz dele e quis saber:
- O que quer dizer?
- Precisamos conversar sobre intimidade. Talvez esteja chegando a hora de consumarmos o casamento.
Victoria sentiu o coração bater mais forte. Ela tinha resistências, medos, mas sabia que ele tinha razão: ela não podia fugir por muito mais tempo.
- Entendo, professor.
- Eu já lhe disse que vou apenas exigir intimidade num nível mínimo. Podemos determinar dias especiais para sexo, e se houver interesse, acordar encontros fora desta agenda. O que lhe parece?
Victoria sentiu-se grata pelo modo como ele parecia se preocupar com ela, mas foi sincera:
- Eu não sei. Na verdade, devo dizer que não tenho experiência nenhuma com sexo.
- Nenhuma?
- Nada – ela deu de ombros – A não ser que beijar conte para alguma coisa.
- Lamento, não é o caso.
- Então, não. Desculpe.
- Não se desculpe, porque você não fez nada de errado. O máximo que posso fazer é prometer ser... gentil.
- Obrigada.
- Sextas-feiras lhe parece adequado?
- Sextas? É amanhã. É isso que quer dizer?
- Eu alertei contra a procrastinação exagerada. Acredito que assim possamos resolver esse assunto e remediar isso.
- Entendo – disse Victoria – Mas gostaria de lhe pedir um favor.
- Pois não?
- Minha formatura ainda está longe, e eu não gostaria de engravidar antes de me formar. Posso lhe pedir para tomar precauções até lá?
- É razoável – disse ele - Eu mesmo prepararei uma poção com essa finalidade que deverá ser tomada uma vez por semana. Mas depois da formatura, eu espero que essa atitude mude.
- Sim, é claro – ela disse – Posso até tomar uma poção de fertilidade, se quiser.
- Não é recomendável na sua idade. Mas poderemos manter essa opção em aberto.
- Parece ser bem razoável. Obrigada por isso, Severo. Eu... confesso que estou surpresa. Você tem se mostrado tão compreensivo e gentil comigo. As pessoas jamais suspeitariam isso de você.
Ele fez um rosto inamistoso:
- Espero que você não saia repetindo isso por aí com suas amigas.
- Não, não. Mas quando ouço alguém falando mal de você, eu gostaria de dizer isso tudo.
- Agradeço por não fazê-lo – ele deu um meio sorriso – Tenho uma reputação a preservar.
Victoria percebeu a ironia:
- Não se preocupe, seu segredo está seguro comigo. Bom, eu vou dormir, acho que o vinho realmente fez efeito – ela se ergueu do sofá – Você vem?
- Não, gostaria de desfrutar um pouco mais dos prazeres de Baco, se não se importa.
- Claro que não – talvez fosse o vinho, talvez fosse outra coisa; o fato é que Victoria se inclinou e deu um beijo casto na bochecha de Snape – Boa noite, Severo.
Ele não respondeu, sentindo o local onde os lábios de Victoria tinham tocado queimando em fogo.
Sem se deter no que tinha feito, Victoria foi dormir.
Severo ainda ficou um bom tempo a consumir vinho, olhando o fogo e tentando controlar seu corpo repentinamente desperto e sem a menor disposição de ir dormir.