Capítulo 6
Tudo estava perfeitamente normal na minha vida desde o acordo de amizade com James. Mas sabe quando você acorda com uma sensação esquisita no estomago? Parecia que alguma coisa estava prestes a acontecer, e não era nada muito bom.
Eu tive essa sensação no momento em que minha mãe entrou no quarto dizendo que tínhamos um jantar na casa dos Black. A primeira coisa que veio a minha cabeça foi se opor. Fala sério, era sábado e eu estava morta de cansada de uma semana de provas. Além do mais, fazia quatro semanas que eu não tinha notícia nenhuma de James. Nadinha. Nem uma mensagem. Ou um sinal de fumaça. Nada.
Claro que eu sempre falava com a Lene, mas não tinha coragem de perguntar sobre ele. Até porque, ele e a Elizabeth estavam ótimos, provavelmente. Deviam estar enlouquecendo nessas festas de riquinhos por aí, ou casando em Las Vegas ou qualquer coisa assim... Não que eu me importasse. Afinal, eu não tinha chance. Digo, eu e James não tínhamos chance alguma.. Não fazia sentido, só isso.
Passei boa parte da manhã revirando o armário a procura de alguma roupa, mas no final escolhi um vestido simples branco de manga comprida e todo de renda. Era simples, mas bonito. Minha mãe fez uma trança no meu cabelo, que estava grande demais já, e eu pus uma leve maquiagem. Não estava exuberante, na verdade, eu não estava mais bronzeada desde a viagem, então minha pele se misturava com o tom do vestido... Mas eu não ligava. Queria mesmo ficar invisível nessa festa.
Eu jamais imaginaria o que estava prestes a acontecer. Se soubesse que seria assim, certamente não teria saído de casa. Não mesmo. Mas é claro que a culpa foi toda minha, afinal eu atraio problemas. Sempre foi assim, e naquela noite não seria diferente.
Quando chegamos à casa dos Black, por volta das 18 horas, muita gente já lotava o belísssimo jardim. Aquele era o lugar mais bonito de toda Londres. Havia todos os tipos de rosas, lírios e outras flores que eu não sei o nome espalhados pelo local. As mesas eram de uma madeira branca e faziam um círculo em volta de um pequeno palco onde uma bela moça morena cantava junto com uma banda de Jazz. Parecia o recanto da paz, no meio do caos da cidade. Enquanto minha mãe ia fazer o social, eu fiquei na mesa sentada apenas apreciando a música. Lene não tinha aparecido ainda e eu não a avistei em lugar nenhum. Então, enquanto ouvia "My girl", fechei os olhos e absorvi a calma e a plenitude daquela bela música e daquela tarde fria de outono.
Foi quando senti um cheiro que não me era estranho. O ambiente estava empestiado de notas cítricas e a voz mais fina do mundo chegou aos meus ouvidos.
-Ora, ora, se não é a morta de fome da Evans!
Contei até três antes de abrir os olhos e encarar aquele ser peculiar e exuberante a minha frente. Elizabeth Saunders estava postada em frente a minha mesa, usando um curtíssimo e justíssimo vestido vermelho em conjunto com botas de couro pretas até o joelho. Não fazia sentido para aquela ocasião, mas é claro que eu não falei nada sobre isso. Nem sequer retruquei a ofensa.
-Olá, Elizabeth. A que devo a honra da sua companhia?
Ela serrou os olhos azuis como se fosse uma cobra prestes a atacar. Eu podia sentir a tensão, mas não entendia, de verdade, porque ela me odiava tanto. Afinal, eu tinha feito tudo que ela queria. Tinha sumido do mapa, da vida do James, de tudo...
-Só passei para dizer que não adianta você nos cercar ou ficar misteriosamente aparecendo nos lugares, porque o James vai voltar pra mim. Ele sempre volta. Não é uma mosca morta como você que vai mudar isso, querida. – e, assim, jogando a bomba no ar, ela foi embora da mesma forma que chegou. Desfilando rapidamente em saltos altíssimos.
Eu engoli em seco, tentando digerir a informação. Como assim o James ia voltar para ela? Quer dizer que eles não estavam mais juntos? E desde quando eu tenho alguma coisa a ver com isso?
O James sequer me procurou. Nadinha. Nem um telefonema. E essa idiota achando que ele estava atrás de mim ou que eu tinha alguma merda a ver com o término deles. Antes fosse.
Mas, apesar de ter acabado de presenciar um ataque de uma cobra de salto de couro, eu só conseguia pensar em como James estava solteiro e não tinha me procurado. Wow. Isso sim foi um baque.
Eu realmente não era nada pra ele. Nem mesmo uma diversão, porque se fosse ele teria ido me procurar.
Nossa.
-LILY! – Marlene surgiu ainda mais rápido do que Elizabeth, pulando no meu pescoço e me dando um daqueles abraços apertados que eram característicos dela. – Onde você se meteu esses dias? Eu senti sua falta.
-Tive semana de provas, estava a maior loucura.. Também senti sua falta. – eu sorri para ela, mas provavelmente meu sorriso não a convenceu muito.
-O que houve? Por que essa carinha? – ela fez um biquinho e eu ri.
-Nada... Onde está o Sirius? – eu olhei em volta, porque ele estava sempre atrás dela, quer ela queira ou não.
-Por aí com o James. Eles saíram antes da festa começar, provavelmente porque o James não queria encontrar a Elizabeth.
-O que aconteceu entre eles? – eu tentei forçar um ar de despreocupada, mas minha curiosidade estava a flor da pele e isso fez Lene dar um sorrisinho de canto de boca.
-Bom, James não quis me falar... Mas acho que ela sacaneou ele de novo. Só sei que eles não estão se falando. – ela deu de ombros e suspirou – Espero que dessa vez eles não voltem. Não aguento ter que aturar essa menina mais.
Lene começou a discursar sobre porque Elizabeth era insuportável, mas eu só conseguia fantasiar sobre o porque de eles terem terminado. Milões de hipóteses vieram à minha cabeça, mas nenhum parecia fazer muito sentido. Eu estava perdida em meus pensamentos sobre aquela vida confusa desse bando de gente rica e doida quando Lene estalou os dedos na frente do meu rosto, rindo.
-Terra chamando Lily! – ela cruzou os braços, da mesma forma que Alice fazia quando estava zangada, mas manteve o sorriso no rosto. – Por que não damos o fora dessa festa chata e vamos parauma festa mais interessante?
-O que? – eu realmente não tinha entendido o que ela chamava de festa interessante. Afinal, eu não sou dessa redoma de cristal de gente que tem festinhas privê por aí... Definitivamente.
-Tem esse amigo do Sirius que me chamou para a casa dele hoje, mas não deve ter muita gente lá, por isso disse que seria meio privê... O Sirius diz que ele só quer me pegar, mas eu nem ligo porque ele é um gato... –ela deu uma piscadela e segurou minha mão. – Vamos?
Por um momento eu ponderei, mas o que diabos eu ia fazer numa festa dessas? Não faz meu estilo, eu não conheço ninguém (além da Lene) e não é o meu mundo... Eu já tinha conseguido bons problemas me metendo com James Potter. Era melhor ficar longe de confusão.
Foi então que eu me toquei que não faria mal acompanhar Lene uma vez só para ver como era, afinal eu sou uma pessoa consciente que precisa esquecer o garoto do ônibus o quanto antes. E ficar trancada em casa não ajudaria muito.
Quando dei por mim, estava no carro de Lene indo para o subúrbio de Londres. Assim. Sem nem avisar a minha mãe direito, inventando que eu e Lene estávamos cansadas e íamos fazer uma festa do pijama. Em menos de dez minutos eu tinha me transformado no tipo de adolescente que mente para a mãe. Ai meu Deus, o que está havendo com você, Lily Evans?
A casa do suposto amigo de Sirius era, para começo de conversa, uma mansão dessas que você para o carro, abaixa o vidro e fala seu nome no interfone. O jardim dele parecia ainda maior que o dos Black. E a mansão era simplesmente linda, cheia de varandas com cortinas brancas esvoaçantes. Quando descemos do carro, dava para ouvir a música alta lá dentro, mas os vizinhos não reclamariam, óbvio. Porque não havia vizinhos. O terreno era gigantesco, a casa mais próxima certamente não ouviria nada.
Não era uma reunião privê. Devia ter umas 300 pessoas do lado de dentro quando entramos. Lene segurou minha mão e saiu desfilando pela sala dando acenos ocasionais para pessoas da Elite britânica. Algumas paravam para falar com ela e eu parecia sua boneca de fantoche, sorrindo e concordando. Meu Deus, onde eu fui me meter?
-Olha só quem resolveu dar o ar de sua graça! –a voz engrolada e debochada de Sirius era reconhecível até mesmo no meio daquele barulho. Mas eu gelei com o toque de sua mão na minha nuca, não pelos motivos convencionais e sim porque se Sirius estava ali... Ai meu Deus. – Sabe quem vai adorar te ver aqui?
Eu entreabri a boca, pronta para avisar que estava de saída, quando ele apareceu.
E aquele mês inteiro sem vê-lo foi por água abaixo. Minhas lembranças dele não faziam jus a sua beleza. Ele estava lá, do mesmo jeito que eu o deixara, só que com as feições mais duras. E visivelmente bêbado.
-Lily! – seu tom era um misto de surpresa e confusão, na certa ele não esperava me encontrar justamente ali. Eu não pertencia àquele lugar, isso era fato. Mas eu não vi um lampejo de alegria em seu rosto. Eu não vi nada. Como eu podia pensar nele toda vez que acordava e pensava no ônibus que teria que pegar? Eu sou mesmo muito burra. James não é para mim e jamais vai ser. Não faz sentido insistir nisso. Eu preciso sair dessa festa o quanto antes.
-Oi, gente. – me afastei um pouco de Sirius, mas continuei o encarando para evitar o olhar de James. Então dei um sorriso amarelo – Eu já estava de saída, mas foi um prazer ver...
-Não! Por que? – Sirius se manifestou primeiro, me pegando pelo braço – Vamos tomar uma bebida, tem um milhão de anos que não nos vemos...
Ele me arrastou até um canto da cozinha gigantesca da mansão com James e Lene em seu encalço. Ele tagarelava alguma coisa sobre como essas festas tinham as melhores bebidas lá dentro e não na sala... Eu não consegui assimilar muita coisa porque sentia James me olhando de rabo de olho ao seu lado. Ai meu Deus, eu preciso sair desse lugar.
-Lily, vou te preparar um Long Island. – Sirius arregaçou as mangas da camisa social e jogou a franja pra trás, num gesto quase obsceno. Eu pude ver Lene segurando-se para não babar e vi duas meninas que estavam na bancada ao lado olhando para ele estupefatas. O Sirius é muito gato mesmo, nossa senhora...
-Sirius, eu...
-Lily, como você quer ir embora sem mim? Deixa de bobeira, a noite mal começou... – ela se debruçou sobre a bancada, deixando seu decote na direção de Sirius e ele não disfarçou o olhar.
-Lene, meu bem, o que você vai beber hoje? – Sirius dirigiu o olhar ao rosto dela e Lene fez cara de poucos amigos, mantendo o sorriso no rosto.
-Nada que você prepare, meu bem. – ela frizou o meu bem num tom de escárnio e umedeceu os lábios – Estou esperando o Peter aparecer para brindar com ele.
A expressão no rosto de Sirius foi de puro desprezo e eu repentinamente notei que perdera algum fato importante nessas semanas longe. James estava ao lado de Lene me encarando curioso. Nossos olhares se encontraram numa fração de segundos e eu senti minhas bochechas esquentarem. Ele dizia muita coisa agora com seu olhar. Parecia que ele estava, antes de mais nada, com raiva de mim. Como assim?
-Eu vou dar uma volta. –então ele se virou e saiu. Assim. Sem mais nem menos.
O que diabos...?
-Aqui, Lily. - Sirius me entregou o copo com o líquido mais azul que eu vi na vida – Pode virar.
Eu estava tão possessa pela raivinha repentina de James que virei mesmo a bebida. Era doce e era forte. Eu me arrependi no instante em que ela desceu pela minha garganta.
-Tem mais? – perguntei, em seguida.
-Wow,wow... Calma, ruivinha... – Sirius riu, balançando a cabeça – Devagar com a dor.
Não sei se Sirius sabia do que estava falando, mas certamente aquela frase marcaria a minha noite.
Lene me puxou para a sala no momento seguinte e fomos dançar. Sirius sumira e ela parecia feliz por isso. Uma música eletrônica tocava e eu senti o lugar mais cheio e mais quente do que no início. Quis desfazer minha trança, porque ela descia pelas minhas costas nuas pelo decote em ''V'' do vestido nas costas. Eu senti alguns olhares sobre mim e sobre Lene, obviamente porque ela estava uma gata vestida para matar. Mas então o tal do Peter apareceu com um amigo mais gato ainda. Os dois eram parecidos. Ou não.
Eles traziam taças de champagne e nós brindamos à vida, à noite... Eu apenas sorria e concordava, mas Peter queria mesmo era tirar Lene de mim. Em poucos minutos eles estavam num canto da sala conversando e eu me via sozinha com o amigo Matt (ou seria Nate?) dele.
Nate tinha belíssimos olhos cor de mel e um cabelo escuro como o de James.
Maldito James. Matt tinha os cabelos comportados e não espetados como os de...
Argh,Lily,esquece esse imbecil!
De repente eu estava dançando muito perto de Matt, suas mãos foram parar nas minhas costas e aquele champagne parecia descer meio torto. Eu acabei o abraçando e encostando o rosto em seu peito. Seu perfume era forte, mas era bom. Eu respirei fundo e esperei a sala parar de girar, mas não adiantou muito.
-Você está bem? – eu podia ouvir sua voz sussurrar no meu ouvido, seu hálito quente no meu pescoço me causando estranhos arrepios. Ele era problema. Eu sabia disso, mas não consegui mentir. Balancei negativamente a cabeça e ele me abraçou e me puxou com ele para algum lugar da casa. Sei que subimos escadas. Sei que viramos à direita.
Eu realmente não deveria ter bebido tão rápido.
Matt me levou até uma confortável poltrona dentro de um aposento afastado da sala. Eu sentei e respirei fundo de novo, contando até dez para soltar o ar. Ele parecia genuinamente preocupado. Ou o meu julgamento estava prejudicado, não sei.
-Estou me sentindo melhor, obrigada. – agradeci, já levantando. – Acho que vou para casa.
-Espera. –ele segurou meu pulso, com um sorriso largo no rosto – Tá cedo ainda, fica um pouco mais.
Ele era estonteante de bonito, mas eu não conseguia fazer isso. Eu não era esse tipo de garota. Estava prestes a dizer isso para o Matt quando ele colou seus lábios nos meus, de repente.
Eu não vi como, não entendi que isso estava acontecendo, mas ele tinha me levado para um quarto. Aquilo era um quarto e a parte de trás dos meus joelhos bateu num colchão.
-Não me entenda mal, mas eu nem te conheço... – eu falei, apoiando minhas mãos no seu peito e tentando parecer sóbria – Eu não quero fazer nada aqui, com você.
Soava bobo, eu sei, mas foi o melhor que pude formular. Matt sorriu, discrente. Pudera, eu estava bebinha... Ai meu Deus.
-Não precisa se preocupar, ninguém vai ficar sabendo... –ele sorriu mais ainda, passando os braços pela minha cintura – É só diversão...
-Não, eu não... Sei me divertir... – tentei ignorar o calor de suas mãos nas minhas costas e seu cheiro bom se alastrando em meus pulmões quando respirei fundo de novo. – Sério. Eu vou embora.
-Podemos ficar conversando só, então... Não acha uma boa idéia? – ele levou os lábios ao meu pescoço e sussurrou no meu ouvido – Só nós dois, aqui.
Então, tudo aconteceu muito rápido.
Parecia um filme idiota de comédia romântica.
Matt tinha sido jogado no chão por ninguém menos que James. Com um baita de um soco. James estava possesso. Ele não parou de socar Matt até eu tocar em seu braço, horrorizada, pedindo para ele parar. Então ele me olhou.
E foi como se ele estivesse agora me batendo.
Não havia só raiva em seu olhar. Havia decepção. Havia nojo.
Mesmo assim, ele me puxou com força pelo braço escada abaixo e eu não consegui abrir a boca para falar nada. Nadica. Nem mesmo perguntar o motivo daquela cena ridícula que eu acabara de ver.
Chegamos ao carro de James e ele praticamente me jogou no assento do carona, batendo a porta com força demais. Eu estava estupefata.
-James, qual o seu...?
-O que foi? Agora vai dizer que você queria estar ali com aquele babaca? – ele socou o volante e soltou o ar devagar em seguida. Eu continuei o encarando, chocada. – Eu não deveria ter te tirado de lá, claro. Por que estou resgatando a bêbada da vez?
-O que...? – parecia que eu estava mesmo ficando sóbria. Não sei se de susto ou de raiva. Talvez fosse os dois – Eu não estou bêbada!
-Ah não? Então aquele babaca não estava se aproveitando de você? Então você queria estar ali? É isso?
-Eu não... O que aconteceu...Pra você me tratar assim? – não fazia sentido nada do que estava acontecendo. Eu queria explicações. Eu queria chorar. Eu queria sair daquele carro maldito.
-Não suportei imaginar o que ele faria com você, Lily, está bem? – ele passou a mão pelos cabelos, bufando – Eu não sou racional nessas horas.
-Ele não... – parei de falar, pensando no quão estúpida era essa situação. E se eu quisesse? E se eu quisesse mesmo transar com o Matt? Por que James impediria isso se ele não sente nada por mim? – O que diabos você quer comigo, Potter?
- O que? – ele me encarou, estupefato.
-É isso mesmo. E se eu quisesse dar pro Matt? Só porque você não me quer, então você acha que ninguém pode querer, é isso? E se eu tivesse mesmo afim dele e não de você? Isso afetaria seu ego?
Não era eu falando. Era o long Island e o champagne. Mas definitivamente não era eu.
-Desculpa, eu não sabia que você era uma dessas vadias que ficam bêbadas e saem dando pros riquinhos... – e antes dele completar a frase eu dei um tapa bem no meio da cara dele. Quem ele pensava que era pra me chamar de vadia?
-Vai se fuder, Potter! – eu levantei do carro e saí, tudo isso numa fração de segundo.
Agora eu que poderia socar alguém até a morte.
Esse babaca filho de uma...
-Onde você tá pensando que vai? – ele estava atrás de mim e puxou meu braço.
-ME LARGA! – eu agora estava gritando, confusa com toda aquela agressão em uma única noite. Quem era essa pessoa e onde estava meu garoto do ônibus?
Numa fração de segundos James estava a dois milímetros de mim.
-Desculpa, eu não queria... Eu estava fora de mim e não acho você uma vadia, nem perto disso.. Me desculpa. – ele falou tudo muito rápido e eu senti vontade de dizer que estava sim tudo bem, mas não percebi que a proximidade dele me fazia prender a respiração. Por fim, não falei nada, apenas acenei com a cabeça e me soltei dele.
A passos largos, eu me dirigi para longe daquela casa. Mal lembrei que não tinha carona e não passava uma alma viva na rua. Pensei em ligar para um taxi, mas meu celular estava descarregador. Ainda assim, o que mais me perturbava era o fato de estar sozinha. Porque ele nao veio atrás de mim.
Parei num banco de um ponto de ônibus e suspirei. Apoiando os cotovelos nos joelhos, escondi o rosto, esperando pelas lágrimas. Mas elas não vieram. E, como num pesadelo, um carro parou na minha frente naquela rua deserta e escura. No entanto, quando o vidro abaixo, o rosto no volante era familiar.
-O que você tá...? – eu balbuciei, incrédula.
-Vim te resgatar. –ele respondeu, seco. – Entra no carro.
Seus olhos azuis sempre gentis pareciam um mar congelante. Mas eu nunca me senti tão aquecida num abraço quando entrei naquele carro. Ele me envolveu em seus braços e acariciou minha cabeça. E então eu chorei, copiasamente, cheia de vergonha, de tristeza e decepção. Mas Amos não perguntou nada. Ele só estava ali para mim. Como em tantas outras vezes.
E só agora eu percebia isso.
