LEMBRANÇAS DE LUZ

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Prólogo

Todas as lembranças do meu passado distante estão imersas em uma luz branca muito intensa e essa luz branca torna impossível distinguir as imagens com a nitidez precisada. É como o sonhar, como a nostalgia. Eu via em minha mente as coisas tais quais são hoje, pouco mudou, mas sempre havia a presença da luz branca quando é uma lembrança. Foi na primavera, com as pequeninas e delicadas flores de cerejeiras caindo das árvores como uma chuva rosada, dispersando o seu perfume pelos jardins, pela mansão, pelo dojo, pelas pessoas.

Minha mãe era a pessoa mais imersa na luz. Ainda posso ver seus olhos perolados idênticos quando me olho no espelho, seus cabelos muito longos e arroxeados, seu pele pálida demais, sua delicadeza enrustida que nunca a abandonara e o seu sorriso doce e cálido. Nesses dias de primavera ela se levantava andando perfeitamente sem deixar que o quimono comprido atrapalhasse seus passos pequenos. Eu a seguia pela varanda até a escada do jardim e por ali descíamos para passear em volta do laguinho com as carpas e o bambu que se enchia e se esvaziava de água, sem nunca fazer outra coisa e sem nunca mudar seu curso.

Tudo isso coberto por flores de cerejeiras.

- Você quer aprender a dançar, Hinata-chan? – ela me perguntava sorrindo, os olhos sumindo em uma risca. Eu manejava a cabeça em afirmação, minha maior alegria era ver minha mãe dançando para depois tentar copiar, desajeitadamente, seus passos maravilhosos. Ela se levantava e tirava do obi seu par de leques brancos – Você se lembra da lição de ontem, querida?

- Uma gueixa é uma mulher que trabalha para entreter, por isso precisa deixar o homem atento a seus movimentos – eu repetia as palavras que ela havia me dito no dia anterior, naquele mesmo lugar, na mesma posição.

- Uma gueixa – ela começava a lição do dia conforme mexia os leques em volta de si, fazendo círculos calmos e bem construídos. Ás vezes os seus movimentos passavam por um momento mais rápido em que o leque voava por cima de sua cabeça vindo das costas para ser aparado com precisão pelo outro loque – Vende suas habilidades, não seu corpo. Conquista através do mistério do pó de arroz, dos lábios vermelhos e da sutileza de seus movimentos.

- Foi assim que Okaa-san conquistou Otou-san? – perguntei enquanto ela terminava a dança e voltava a se sentar, as pernas juntas e inclinadas para o meu lado, sempre muito ereta, muito bonita.

- Não sei se eu o conquistei ou se ele me conquistou – eu me lembro que até a forma de ela rir era delicado, um sopro, um suspirar. Ela olhava para os muros e parecia enxergar suas memórias com uma nitidez que eu não consigo e dizia, cheia de paixão – Eu e outras gueixas sempre éramos chamadas para entreter os homens do Clã depois das reuniões. Isso ainda acontece hoje, mas com gueixas mais jovens. Um dia seu pai estava lá, era sua primeira reunião, e também era a minha iniciação como uma maiko(1).

- Eu esqueci o que é uma maiko, Okaa-san.

- É a aprendiz de gueixa – ela explicava pacientemente – E como nós dois éramos novos nas reuniões o seu Ojii-san pediu para que eu ficasse a entreter o seu Otou-san. Ele era muito tímido e sério – ela imitava as sobrancelhas franzidas e as rugas nos lados dos lábios de meu pai, mas nas feições suaves dela nunca parecia que Otou-san era tão rígido como ele é – Ele não respondia as minhas conversas e nem pareceu gostar quando eu toquei o shamisen(2), então, como último recurso, eu fui dançar – ela parava um momento e sorria tocando meu nariz com a ponta do indicador – E só assim eu consegui fazer com que ele olhasse para mim.

- Não tem como não olhar quando Okaa-san dança.

Riamos juntas e uma das criadas aparecia curvando-se e dizendo que o chá já estava pronto. Okaa-san se levantava e a seguia comigo em seu encalço, admirando, sempre observando. Minha mãe era o ser mais gracioso do mundo e seus movimentos me eram hipnotizastes. Nos meus pensamentos de criança eu queria ser como ela, queria ser uma gueixa, e pensava ser por isso que ela me ensinava, que ela me contava as histórias dessa cultura. Ela me ensinava como servir o chá, como tocar o shamisen e a shukahachi(3), lia para mim as mais bonitas poesias, me explicava como fazer o mais magnífico nó no obi. E eu, como uma esponja, absorvia suas palavras para nunca mais esquecer, mesmo agora ela estando envolta da névoa luminosa.

Enquanto eu não estava com Okaa-san, nos momentos em que ela tinha que descansar por causa de sua saúde frágil, eu ficava junto de Otou-san e as memórias com ele são as mais nítidas que eu guardo. Eu me lembro sempre das paredes e do chão de madeira bem polida do dojo, da roupa preta do treino e os membros doloridos. As lembranças de Otou-san não vêm com cheiro de cerejeiras, era cheiro de madeira e suor. Ali ao lado ficava Neji-nii-san e Hizashi-oji-san.

- Não vou mais permitir que Hikari fique falando sobre gueixas com você, Hinata. Você está com a cabeça nas nuvens e não se concentra! – ele ordenava com o tom de voz elevado, eu senti Neji se mover ainda ajoelhado.

- Desculpe, Otou-san – eu lhe pedia de cabeça baixa.

- Vá agora.

Mas os encontros com minha mãe, às aulas sobre gueixas, as lições, nunca eram interrompidas.

Quando chegou o inverno e mesmo com a barriga proeminente de minha mãe pela gravidez de Hanabi, ela não deixou de me ensinar. Agora eu mesma conduzia o leque enquanto ela cantava, eu servia o chá enquanto ela tocava o shamisen, eu lia até fazê-la dormir. Com os meses passando e as estações mudando, minha Okaa-san ia ficando mais pálida, seus lábios já não pintava mais, seus olhos quase não mais se abriam. E seus sorrisos desapareciam rapidamente.

Quando Hanabi nasceu Okaa-san não abriu mais os olhos.

Durante o seu velório não me foi permitido chorar, não me foi permitido abaixar a cabeça. Eu era a herdeira primogênita do Clã Hyuuga, um dos clãs mais poderosos e antigos da Vila Oculta da Folha. Eu só voltei para o meu quarto depois sem olhar para nada e deitei no futón. Ali, e somente ali, uma única vez, eu chorei pela minha mãe. Os ensinamentos de gueixa ficaram esquecidos nas lembranças de luz e o que passou a ser nítido até hoje foram as lições ninja. O toque do shamisen agora era o retinir das kunais, o servir do chá era o movimento do Jyuken, a dança era o poder do Byakugan. Ao morrer minha mãe levou com ela minhas vontades de ser uma gueixa, levou seus sorrisos e palavras gentis. Acabara-se a época da chuva rosada.


Hinata pousou o pincel de volta no suporte e assoprou levemente o pergaminho para apressar a tinta a secar. A caligrafia impecável era como uma obra de arte sobre o papel. Enrolou-o novamente, colocou na gaveta de sua mesinha e apagou a vela. Ainda era muito cedo, mas já era hora de ir. Levantou-se com as pernas doloridas de ficar em uma mesma posição por muito tempo e vestiu o casaco lilás e branco. Encaixou na perna a bolsa de kunais e saiu do quarto fechando a porta de correr atrás de si. Caminhou lentamente pelos corredores de madeira até a entrada do Clã Hyuuga e saiu a caminho do seu local de treinos com seus companheiros de time.

As ruas da Vila, mesmo ainda sendo quase de madrugada, eram sempre movimentadas. Os comerciantes armavam seus negócios e vários ninjas circulavam nas ruas ou sobre as edificações. Hinata parou em uma venda e comprou alguns dangôs(4) para levar para Akamaru. Passava em frente à Academia Ninja quando avistou Yamato andando em sua direção.

- Bom dia, Yamato-san – disse quando se aproximaram o suficiente.

- Oi, Hinata – ele respondeu sorrindo – Que bom que eu encontrei você.

- Aconteceu alguma coisa?

- Não, é Tsunade-sama que quer que você vá agora ao escritório dela. É uma missão em que você se faz necessária.

- Certo, vou avisar Shino e Kiba – ela disse fazendo uma pequena reverência e começando a andar apressada.

- Espere, Hinata – ela parou e se virou – Shino e Kiba não estão escalados pra essa missão, ela só me mandou chamar você.

- Oh, certo – ela assentiu, mas olhou para baixo, para o saco com dangôs que segurava, e ficou indecisa – Pode me fazer um favor, Yamato-san?

- Um favor?

- Pode levar isso a Shino e Kiba? São doces para Akamaru.

- Claro, Hinata – ele sorriu pensando que seria alguma coisa complicada. Ela lhe sorriu de volta – os gaguejos e os rubores não eram mais traços enrustidos de sua personalidade, eram somente respostas ocasionais a uma situação embaraçosa – e entregou-lhe o saco de papel despedindo-se e correndo para o prédio da Hokage. Yamato sorriu com as mudanças em Hinata. Pequenas, mas perceptíveis.


Estava tudo completamente escuro, do jeito que ele gostava. Somente ás vezes o vento passava por baixo da porta movimentando sua cortina e deixando uma nesga de claridade entrar e incidir direto sobre sua cama, bem em cima de seus olhos. Rolou para o lado e sentou-se, derrotado. Não tinha mais sono. Bagunçou ainda mais os cabelos e abriu os olhos devagar. A cortina balançou mais uma vez e quando ele meteu os pés para fora do edredom e da cama um ANBU surgiu pendurado no seu teto.

- Uchiha Sasuke-san – disse o ANBU.

- Pare de ficar entrando na minha casa – respondeu seco.

- Compareça imediatamente ao escritório da Hokage – e, como sempre, quando o ANBU entrava para anunciar a mesma coisa, todas às vezes, Sasuke lhe respondia bruscamente e o ANBU o ignorava. Bufou e o shinobi mascarado sumiu em fumaça branca.


- NARUTO! – gritou Sakura tentando fazer o rapaz loiro acordar.

- MIL ANOS DE DOR NÃO, KAKASHI-SENSEI! – gritou o loiro pulando da cama assustando e olhando para os dois lados em desespero. Não havia nenhum Kakashi-sensei, mas uma Sakura com um olhar nada, nada amigável – O que você está fazendo aqui, Sakura-chan?

- Estou tentando te acordar faz uma hora, seu idiota! – os olhos dela pegavam fogo e tinha os punhos enluvados levantados ameaçadoramente.

- Ah, ah... – ele se afastava – D-desculpe, Sakura-chan, é que eu fui dormir muito tarde ontem, dattebayo!

- Não me interessa! – e socou-lhe atirando Naruto pela janela do seu apartamento. Suspirou relaxando e correu para pega-lo de cima de um telhado e arrasta-lo ainda de pijamas para a sala de sua mestra.


Hinata bateu na porta do escritório da Hokage e não demorou a ouvir o chamado para entrar. Tsunade estava usualmente sentada em sua cadeira de espaldar alto, pergaminhos estendidos a sua frente, os cotovelos sobre eles e as mãos cruzadas dando-lhe uma pose de pensativa. Ao seu lado, em pé, estava Shizune segurando o porquinho Tonton.

- Mandou me chamar, Tsunade-sama? – a Hyuuga perguntou fechando a porta.

- Sim, Hinata, obrigada por vir depressa. Assim que os outros chegarem eu vou explicar o que está acontecendo.

- E quem seriam esses outros além de nós dois? – a voz de Sasuke veio da janela. Já completamente trocado com suas roupas negras e o colete Jounin, a bandana da Folha reluzindo em sua testa. Estava recostado a janela, as mãos nos bolsos. Ele encarou a tímida Hyuuga por um segundo tentando se recordar se alguma vez já tivera uma missão com ela, ou melhor, se alguma vez já falara com ela. Não conseguiu lembrar de nada.

- Que bom que chegou, Sasuke – disse a Hokage – E pare de entrar pela janela, você está ficando muito igual ao Kakashi.

- Se você parar de mandar ANBUs na minha casa – ele aproximou-se da mesa ficando ao lado de Hinata, mas encarando a mulher loira.

- É o jeito mais rápido de mandar mensagens.

- O que aconteceu com aquele pássaro irritante? Finalmente alguém tacou uma kunai nele?

- Foi – Tsunade olhou ameaçadoramente estreitando os olhos para a maneira descontraída com que ele dissera aquilo – E já estou com uma idéia de quem tenha sido.

Mas as suspeitas de quem teria sido o assassino do pássaro mensageiro pararam por aí, pois no momento seguinte algo arrebentou a porta de entrada da sala rolando pela extensão até bater na mesa da Hokage e ficar estirado entre Hinata e Sasuke, ambos encarando a tal coisa sem entender. A tal coisa, porém, era Uzumaki Naruto. E a pessoa que o atirara através da porta fora uma nada controlada Haruno Sakura que passava por seus destroços bufando e colocando-se, os braços cruzados, ao lado de Hinata.

- Levante ele, Sasuke – Tsunade recostou-se a sua cadeira e suspirou enquanto Sasuke pegava Naruto pelo colarinho e o colocava em pé bruscamente. Que manhã agitada! Quando Naruto já conseguia ficar firme sobre suas pernas sem a ajuda do amigo e já estava com os olhos suficientemente abertos, vestido ainda com seu pijama azul e a toquinha na cabeça, a Hokage colocou sobre a mesa em frente a eles a foto de um homem muito bonito, jovem, os cabelos pretos penteados para trás e os olhos aquosos de um verde escuro – A missão que eu tenho para vocês quatro é conseguir informações sobre as atitudes desse homem, Masaru Ren.

- Quais informações? – perguntou Sasuke enquanto Sakura pegava a foto e juntava-se com Hinata para olhá-la.

- Depois do ataque de Pain há quatro anos não posso me dar ao luxo de permitir que a Vila da Folha seja atacada novamente em um espaço de tempo tão curto e chegaram informações a mim de que este homem deseja fazer isso com um exército de mercenários dos países que são contra o País do Fogo – a mulher virou sua cadeira para a janela e observou o sol ainda baixo – Eu estou mandando vocês para verificarem a veracidade dessas informações e tomarem as devidas providências caso se mostrem corretas.

- Teremos que matá-lo? – perguntou Naruto.

- Somente se entrarem em combate, senão basta trazê-lo para a Vila que tomaremos as devidas providências com sua prisão.

- Quando partimos? – Sakura devolveu a foto para cima da mesa.

- Espere, Sakura, eu ainda tenho que dizer os detalhes da missão – os olhos âmbar de Tsunade pousaram nos perolados de Hinata – Hinata...

- Hinata-chan! Você estava aí, dattebayo? Quando você chegou?

- Ela estava aqui o tempo todo, idiota! – disse Sakura.

- Não me interrompam! – urrou Tsunade olhando para eles. No momento seguinte depois desse berro estridente eles ficaram imóveis, os braços colados ao corpo, como estátuas. Sasuke manteve-se impassível, como sempre, as mãos cruzadas sobre o peito e os olhos fechados e Hinata sorriu gentilmente – Hinata – a garota a olhou, esperando – Eu lamento pelo que aconteceu a Hikari.

Todas as cabeças, incluindo Sasuke que abriu os olhos, voltaram-se sem entender para Hinata. Ao ouvir o nome de sua mãe a garota levou as mãos ao peito, apertando uma a outra. Não abaixou a cabeça, não quis desviar os olhos. Só esperou a sannin continuar.

- Ela era uma mulher maravilhosa e minha amiga, eu lamento não ter podido ajudar – a impressão que a garota teve foi que Tsunade lhe estava dizendo aquilo como uma súplica esperando de Hinata um perdão que ela não precisava receber. A morte de sua mãe já fazia muito tempo que tinha acontecido e, apesar da saudade dolorosa que sempre lhe agulhava o peito quando lembrava dela, não havia porque lamentar mais.

- Por favor, Tsunade-sama – a voz de Hinata era tão suave como sempre e ela sorria, com os lábios e com os olhos – Não lamente.

Tsunade olhou para a mesa um segundo antes de levantar a cabeça e continuar, ainda encarando a primogênita Hyuuga:

- Não quero causar nenhuma dor a você – Hinata balançou a cabeça negativamente como se dissesse que não iria. A loira olhou, então, para os outros três voltando a ter sua voz enérgica – Masaru Ren é o senhor de um feudo ao norte do país muito conhecido por suas ricas casas de chá e suas gueixas. Vou mandar os quatro pra lá sob disfarces – ela encarou Sasuke – Sasuke vai se apresentar a Masaru Ren como você mesmo. Já que voltou a Vila há tão pouco tempo e só tem saído para missões mascarado poucas pessoas sabem do seu retorno. Masaru vai querer te recrutar para o exército dele caso a informação seja verdadeira. Você estará lá como um freqüentador da casa de chá.

Sasuke apenas murmurou algo inaudível em concordância e Sakura fechou a cara. Não tinha gostado da idéia do seu Sasuke-kun em meio a gueixas, em meio a prostitutas. Mudou sua expressão quando sua mestra cravou seus olhos nela e em Hinata.

- Vocês duas serão mandadas para lá com o disfarce de gueixas. Não sei se as duas serão aceitas, mas caso não sejam trabalhem lá de alguma outra forma.

- Tsunade-sama – chamou a Haruno levemente escandalizada – Você irá nos mandar pra lá para trabalharmos como... – enroscou na palavra e engoliu limpando a garganta - ...prostitutas?

O semblante da Hokage se anuviou e seus olhos se tornaram pedra. Sakura realmente se assustou e pensou que Tsunade fosse pular em seu pescoço, mas a voz de Hinata desviou as atenções de si e a salvou:

- Gueixas não são prostitutas, Sakura-san, são artistas – ela abaixou os olhos – Minha mãe era uma gueixa do Clã Hyuuga.

As bochechas de Sakura se fizeram quentes e escarlates e ela ficou sem saber o que dizer até mesmo para se desculpar.

- Eu sei que Hikari passou as lições de gueixa para você, Hinata, então, por favor, ensine o que Sakura precisa saber durante a viagem. São quatro dias de viagem até o feudo e eu sei que não será possível ensinar tudo, mas pelo menos o básico.

- Sim, Tsunade-sama.

- Oi, Tsunade-baa-chan, você tá esquecendo de mim, dattebayo! – exclamou Naruto, impaciente como sempre, espalmando as mãos por sobre a mesa da Hokage. A mulher loira deu-lhe um peteleco irritado na testa, porém fraco.

- Você vai ser serviçal! – berrou para ele.

- QUÊ?! Porque eu não posso ser o cara legal e o teme o serviçal? – ele berrou de volta.

- Você vem de um Clã nobre? Você é um ex-foragido perigoso? Você é um ser inexpressivo e apático? – uma veia saltou na testa de Sasuke – Não! Você ficou conhecido depois de derrotar a Akatsuki, seu idiota, como espera que eu te mande para lá como mercenário se você é o salvador da Vila da Folha?

Naruto não disse mais nada. Recuou e colocou as mãos atrás da cabeça abrindo o seu sorriso enorme. Sakura e Hinata sorriram das palavras de Tsunade e da reação do loiro, Sasuke suspirou.

- Um dia esse seu ego inflamado ainda vai te fazer explodir – disse o moreno e Naruto lhe mostrou língua.

- Shizune, arrume o disfarce do Naruto e chame Kotetsu ou Izumo para arrumar a porta – Tsunade voltou a sentar – Sasuke será o líder da missão, vocês estão dispensados. Arrumem suas coisas, partirão ao entardecer.

Todos os quatro de viraram para sair pela porta quebrada, Naruto na frente sorrindo muito largamente, seguido por Sakura e Sasuke, as mãos nos bolsos, e Hinata.

- Esperem! – eles pararam e se viraram. Os olhos de Tsunade estavam fechados – Só mais uma coisa – ela os abriu – Se for necessário que vocês duas precisem fazer o ritual de venda do mizuage(5) para conseguirem mais informações – Hinata e Sakura se fizeram escarlates – Será você quem irá comprá-lo, Sasuke.

A morena se fez ainda mais escarlate e pensou que fosse desmaiar, suas mãos começaram a suar só de imaginar que poderia haver a possibilidade dela ter que colocar sua virgindade a venda e ainda mais Sasuke, Uchiha Sasuke, compra-la. A rósea, por outro lado, relaxou. Se fosse Sasuke quem a comprasse então estaria tudo bem, não haveria problema. O Uchiha por sua vez não se sentiu confortável com a situação e Naruto foi o único que ficou sem entender nada.

- Desse jeito não haverá problema, pois Sasuke não precisará consumar a compra – ela finalizou – Podem ir agora.

Os quatro saíram da sala, em silêncio, menos Naruto:

- Eu não entendi a última parte, então vou tomar café da manhã, dattebayo! Quem quer ir ao Ichiraku comigo? – ninguém se pronunciou, mas todos os quatro seguiram com Naruto na direção da barraquinha de lámen.

- Hinata-chan! – uma voz ao longe gritou fazendo os quatro pararem no meio de caminho e se virarem para ver Inuzuka Kiba e Akamaru correndo até eles. Aburame Shino vinha atrás, andando, paciente.

- Kiba-kun, Akamaru-kun – ela respondeu ao chamado e pousou a mão em uma carícia leve na cabeça do grande cão branco quando eles se aproximaram. Ele lhe sorriu e Shino juntou-se ao grupo.

- O que você está fazendo de pijama, Naruto? – perguntou Kiba olhando-o de cima a baixo. Naruto corou olhando-se também. Tinha se esquecido que Sakura o tinha atirado para fora de casa pela janela sem ter dado tempo para que o rapaz se trocasse nem nada do tipo.

- Isso não é pijama, essa é um novo estilo de roupa ninja, é a última moda, dattebayo! – ele fez a pose "Nice Guy" tentando ser convincente.

- É, a última moda se você for Maito Gai e Rock Lee, dobe – desdenhou o Uchiha.

- Teme! – gritou o loiro.

Shino e Kiba olharam a discussão por um segundo, assim como Hinata com um sorriso. Mas Shino fez o favor de voltar à realidade.

- Yamato disse que você tem uma missão.

- Sim – ela respondeu – Naruto-kun, Sakura-san e Sasuke-san também vão. Vamos a um feudo colher informações.

- Tome cuidado – disse Kiba. Ela não respondeu, apenas sorriu. Depois do ataque da Akatsuki em que Hinata quase morreu tentando proteger Naruto na luta contra Pain, Kiba e Shino tinham se tornado muito mais protetores com a garota Hyuuga. E Neji também, mais que qualquer um deles. Afinal, ele era o guardião de Hinata e não lhe fora útil quando necessário – É bom tomar conta dela, Naruto!

- Deixa comigo, dattebayo!

Hinata sorriu, mas uma parte dentro dela reclamava por Kiba tomar essas atitudes. Ela já estava ficando cansada de todos terem que a proteger, de todos insistirem em dizer isso uns pros outros. Era uma coisa ruim no estômago ter que ouvir Kiba pedindo para outro tomar conta dela, como se ela fosse uma peça rara que não podia se quebrar e tinha que ser guardada com esmero e cuidado. Ela não se sentia, ela não era mais uma peça rara.

- Desculpe, tenho que ir – a Hyuuga curvou-se querendo sair dali o mais rápido que conseguia – Até logo!

E deu as costas aos companheiros seguindo na direção do Clã Hyuuga.

- Pare de ser tão estupidamente inconveniente, Kiba.

- Do que é que você está falando, Shino?

- Hinata não é uma criança. Querer que todos a protejam e dizer isso na presença dela é fazer com que ela se sinta ainda pior – os olhos por trás do óculos de Shino continuavam fitando o caminho que ela havia seguido rumo a casa – O melhor jeito de protegê-la é confiar nela.

O Aburame recomeçou a andar deixando-o para trás sem se despedir. Kiba o seguiu não muito tempo depois e eles desapareceram numa esquina seguindo para as áreas de treinamento. O Time 7 continuou parado por um segundo enquanto observavam as coisas acontecerem. As mãos de Sasuke voltaram para seus bolsos e ele se virou, todos recomeçaram a andar para o Ichiraku, em silêncio, até Sasuke se pronunciar:

- As palavras de Shino servem para você também, Naruto.

- Mas eu devo isso a ela – respondeu cabisbaixo. Na sua mente as palavras de Hinata passaram como uma gravação antiga. A declaração, a luta, a conversa entre eles dois depois que tudo terminou, a tentativa de um relacionamento, a frustração, o fim. Eles tentaram, porém era um sentimento equívoco.

Depois de tudo, o que Hinata e Naruto nutriam um pelo outro era carinho, compreensão, afeto.

- Não, você deve, mas só tem que pagar quando for cobrado – e no lugar em que Sasuke se encontrava sobrou apenas uma nuvem de fumaça branca.


Hinata abriu a porta de correr do armário e ficou na ponta dos pés para alcançar as últimas caixas, um espaço que nunca pensou que tocaria novamente. Fechou os olhos quando a caixa velha deslizou para suas mãos e deixou cair de sobre si um monte de poeira. Ajoelhou-se e colocou a caixa no chão tossindo um pouco. Limpou-a com as mãos sem se importar de sujar os dedos e levantou a tampa. O conteúdo estava intacto, enrolado em papel de seda branco. Ela abriu o papel de seda e pegou o quimono pelo colarinho levantando-se e estendendo-o no cabide. Alisou-o com carinho sentindo cheiro de flores de cerejeira por baixo do cheiro do passado. Afastou-se um passo para ver o desenho que o quimono esticado formava, no corpo e no pano dos braços. Ele era branco e havia montanhas ao longe e uma árvore em primeiro plano de onde folhas outonais caiam suavemente. Aquele fora o primeiro quimono de verdade que sua mãe havia lhe dado, um presente para quando crescesse. Nunca o usou.

Ficou novamente na ponta dos pés perto do armário e retirou outra caixa, idêntica a primeira, e fez o mesmo procedimento. Guardou o quimono de outono e estendeu esse último no cabide. Este era vermelho e havia nele o desenho de carpas como se elas estivessem nadando em um lago rubro. O terceiro quimono era azul escuro e tinha sombreados em branco-acinzentado formando uma neblina ao redor da silhueta negra de um castelo ao fundo e uma lua brilhava perto do colarinho. O último quimono que pegou era totalmente negro em pano com apenas uma garça branca em sua extensão quebrando a dureza do ébano. As pontas das penas de suas asas abertas em leque eram vermelhas, brilhantes. Dobrou todos os quimonos com ainda mais cuidado e os enrolou em papéis de seda novos antes de guardar na mochila que levaria na missão. Olhou para o sol da tarde, não iria demorar a entardecer.

- Hinata-sama – a voz de Neji veio do outro lado da porta.

- Entre, nii-san – a porta deslizou e Neji entrou no quarto. Os cabelos longos e muito negros emolduraram as feições preocupadas do Hyuuga – Algum problema, Neji-nii-san?

- Você vai sair em missão – a afirmação dele fez com que o seu estômago desse mais daquelas coisas ruins no estômago. Era mais um que queria que ela fosse protegida.

Seu pai queria que ela ficasse forte, outros queriam que ela ficasse segura. E ela, o que queria? Queria alguém que acreditasse. Ela precisava de alguém que acreditasse que ela poderia fazer tudo para que ela realmente conseguisse fazer tudo. A última pessoa que havia acreditado nela cegamente agora estava morta.

- Sim – ela disse dando-lhe as costas e pegando a mochila e o casaco lilás que estavam sobre sua mesinha – Eu e Naruto-kun, Sakura-san e Sasuke-san.

Ele assentiu com a cabeça, mas Hinata não viu. Virou-se com um sorriso e disse:

- Preciso ir, Neji-nii-san, já está quase na hora – ele deu passagem para ela, mas segurou seu braço quando já estava no corredor a impedindo de prosseguir. Ela sabia o que vinha a seguir e não queria escutar.

- Volte viva – a outra mão de Neji, a que não lhe segurava o pulso, elevou-se até a têmpora de Hinata e tocou-lhe de forma suave a mecha de cabelo caída ali. A pele pálida tomou a coloração vermelha quase imediatamente que ela sentiu os dedos de Neji descerem para sua bochecha. Fechou os olhos e sentiu o apertou em seu pulso de afrouxar.

Curvou-se e disse depressa, se virando para o corredor:

- Avise Hanabi-chan por mim, por favor, nii-san – ela seguiu pelos corredores muito conhecidos do Clã Hyuuga em uma direção certa. Passou pelo corredor de fora em que podia ver as cerejeiras e a ponte, mas não olhou para os lados. Diminuiu a velocidade e ajoelhou-se colocando as coisas ao seu lado. Esperou o coração desacelerar antes de chamar respeitosamente – Otou-san?

- Entre, Hinata – ela abriu a porta. Dentro do cômodo seu pai estava sentado atrás de sua própria mesinha, vários pergaminhos enrolados estavam dispostos ao seu lado e a sua frente. Ele não levantou a cabeça para olhá-la nem parou o pincel que deslizava rapidamente pelo pergaminho – O que quer?

- E-eu vim avisar que estou saindo em missão, Otou-san – com seu pai, com toda a sua indiferença, ela não conseguia evitar se sentir nervosa jamais. Era irônico pensar que a pessoa que lhe devia ser mais próxima era a que mais lhe tratava com indiferença.

Hinata não notou, tinha os olhos baixos encarando suas mãos sobre as pernas, mas o pincel que Hiashi segurava parou e começou a tremer muito levemente.

- Vai ficar fora quanto tempo?

- Não... Não sei ao certo.

- Muito bem – o pincel voltou a correr – Faça o que tem que fazer.

- Sim – ela curvou-se – Estou indo.

Deslizou a porta e fechou-a. Dentro do cômodo Hiashi pousou o pincel e amassou o pergaminho. Sua letra tremida estava ilegível. Hinata colocou o casaco e depois a mochila. Caminhou até o portão do Clã e anunciou, em voz baixa, que estava saindo para ninguém em particular, apenas como costume. Olhou para o sol e ele já estava quase beirando o horizonte.


Pouco antes de minha mãe morrer no parto de Hanabi ela me chamou ao seu quarto, me fez sentar e ler para ela. Eu obedeci, como sempre. Quando eu fechei o livro e pensei que ela estivesse dormindo sua mão branca tocou meus joelhos e por entre seus lábios saíram às palavras que eu jamais iria esquecer:

- Lembre-se sempre, Hinata-chan, que você é como um raio de luz. Não como a luz do sol que ilumina tudo, mas como a luz da lua, que ilumina um ponto de escuridão por vez – ela fechou os olhos e eu pensei que finalmente tivesse dormido. Me levantei e fui até a porta, mas parei novamente quando ouvi sua voz – Você não pode olhar diretamente para o sol, mas sempre pode admirar a lua.


(1)Maiko: Aprendizes de gueixas. Tradução para dança infantil.

(2)Shamisen: Instrumento musical japonês de três cordas.

(3)Shukahachi: Uma espécie de flauta de bambu de aproximadamente 30cm.

(4)Dangôs: Bolinho japonês feio de farinha de arroz tradicionalmente servido em palitos e com chá verde.

(5)Mizuage: Na verdade o ritual do mizuage é o rito de passagem da gueixa de uma idade para a outra, onde elas começam a se vestir melhor e mais ricamente. Aqui o ritual está como venda da virgindade para se adequar a fic.

Otou-san: Pai

Okaa-san: Mãe

Ojii-san: Avô

Obaa-san(Baa-chan): Avó

Oji-san: Tio

Nii-san: Irmão mais velho.

Hikari – Eu não sei o nome da mãe da Hinata, mas como todos os nomes do Clã Hyuuga têm a ver com luz (menos o Neji que significa "parafuso") eu escolhi esse, pois significa "luz".


Olá!

Hei, mais uma fic começando! Para um prólogo até que ficou bem maior do que eu esperava. Quero avisar desde agora que essa fic é inspirada no filme "Memórias de uma Gueixa", recomendo que assistam. E essa é uma fanfic Sasu/Hina, que fique claro, mas não quer dizer que eu não posso colocar um pouco de outros casais. Qualquer dúvida ou qualquer erro que eu tenha cometido, por favor, me avisem.
Aviso: não garanto atualizações rápidas!
Espero que gostem de mais essa leitura, estou fazendo pra vocês de coração!
De presente especialmente para
Marcy Black! e para mim, porque no dia do aniversário dela (11/05) completo 4 anos aqui no site!

OBRIGADA POR LEREM!

Beijos, Tilim!

P.S.: Fiquem atentos ao próximo capítulo de "Projeto Hyuuga", quem sabe não sai um !BÔNUS!?